marcar-conteudoAcessibilidade
Tamanho do texto: A+ | A-
Contraste
Cile Logotipo
Estudo

[8] A grande dívida de gratidão para com o Sutra de Lótus e a proteção recebida por aqueles que propagam a Lei Suprema da Iluminação Universal

"Abertura dos Olhos"

download do ícone
ícone de compartilhamento

01/09/2005

[8] A grande dívida de gratidão para com o Sutra de Lótus e a proteção recebida por aqueles que propagam a Lei Suprema da Iluminação Universal
Os requisitos de um devoto do Sutra de Lótus Antes de iniciar o tópico seguinte, gostaria de sintetizar os principais pontos abordados na ocasião passada sobre a identidade de Nitiren Daishonin como devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei.

Daishonin diz que o requisito mais importante de um devoto é o juramento de manter a fé inabalável no Sutra de Lótus, o ensino da iluminação, e de compartilhá-lo com os demais, independentemente das dificuldades que possa enfrentar ao longo do caminho.

Em seguida, ressalta a importância de perseverar, especificamente no sentido de suportar as perseguições. A característica marcante do devoto do Sutra de Lótus é sua capacidade de permanecer fiel ao próprio juramento e persistir mesmo em meio aos piores obstáculos. No entanto, isto não é simplesmente uma questão de resistência passiva, ao contrário, significa empreender uma batalha incessante para vencer cada provação e sair vitorioso.

Além da perseverança, Daishonin inclui a benevolência como outro requisito fundamental. Isto porque a força para suportar as dificuldades deriva da benevolência pelos demais. Nada pode alterar a benevolência de um devoto do Sutra de Lótus decidido a conduzir todas as pessoas dos Últimos Dias da Lei à iluminação. Frente a essa benevolência, até os maiores obstáculos, conforme diz Daishonin, “nada mais são que poeira lançada ao vento”. (Os Escritos de Nitiren Daishonin [END], vol. IV, pág. 201.)

Por fim, ao explicar o princípio budista de “adotar voluntariamente o carma apropriado”,1 Daishonin ensina que um devoto que pratica exatamente como prega o sutra pode superar com serenidade todos os sofrimentos e dificuldades, que são parte da vida, e atingir um estado de vida de ilimitada alegria.

As dúvidas dos demais e as próprias dúvidas de Daishonin

Contudo, as pessoas criam dúvidas em relação a mim e eu também tenho dúvidas sobre mim mesmo. Por que os deuses não me protegem? Os deuses celestiais e outras divindades guardiãs fizeram seu juramento diante do Buda. Ainda que o devoto do Sutra de Lótus fosse um macaco, eles deveriam tratá-lo como devoto do Sutra de Lótus e correr para auxiliá-lo a fim de cumprir o juramento que fizeram diante do Buda. Será que o fato de eles não agirem assim significa que, na verdade, eu não sou o devoto do Sutra de Lótus? Essa dúvida representa a essência deste escrito. E por essa ser também a questão mais importante de toda a minha existência, irei mencioná-la constantemente e enfatizá-la mais do que nunca antes de tentar respondê-la. (END, vol. IV, págs. 75-76.)

Nitiren Daishonin havia feito um juramento, tinha perseverança, benevolência e manifestava alegria. Em outras palavras, possuía um estado de vida elevado. Dessa forma, nem é preciso dizer que ele havia se levantado com a convicção de que era o devoto do Sutra de Lótus dos Últimos Dias da Lei. Contudo, em “Abertura dos olhos”, ao mesmo tempo em que expressa sua firme convicção, Daishonin também fala de sérias dúvidas. Ele diz: “Contudo, as pessoas criam dúvidas em relação a mim e eu também tenho dúvidas sobre mim mesmo. Por que os deuses não me protegem? (...) Será que o fato de eles não agirem assim significa que, na verdade, eu não sou o devoto do Sutra de Lótus?”

Ele se pergunta por que as divindades celestiais não protegem o devoto do Sutra de Lótus. Certamente, diante do Buda Sakyamuni, essas divindades juraram proteger rigorosamente todos aqueles que praticassem o Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei, não importa quem fosse essa pessoa. Será que a falta de proteção significava que ele não era o devoto do Sutra de Lótus? Esta dúvida relaciona-se estritamente aos motivos que o levaram a escrever este tratado.

A severa punição do governo a Daishonin, que culminou na Perseguição de Tatsunokuti (e na tentativa fracassada de execução em 12 de setembro de 1271), e seu posterior exílio na Ilha de Sado, foi também dirigida à comunidade de seus seguidores. Muitos de seus discípulos foram perseguidos e punidos. As autoridades lhes aplicaram multas, confiscaram suas terras ou os enviaram para o exílio. Como resultado, a grande maioria de seus seguidores em Kamakura abandonou a fé. Daishonin escreve: “Entre meus discípulos e seguidores, os que são covardes, em sua maioria, abandonou a fé ou perdeu o verdadeiro espírito” (Gosho Zenshu, pág. 1224); e “Quando fui preso, de mil pessoas, 999 abandonaram a fé” (The Writings of Nichiren Daishonin [WND], pág. 469).

Na sociedade, muitos se perguntavam com desdém por que, uma vez que Daishonin realmente era o devoto do Sutra de Lótus, ele e seus seguidores não estavam sendo protegidos pelas divindades celestiais. É possível que esse tipo de dúvida também tenha ocorrido a muitos de seus seguidores que abandonaram a fé. Entretanto, os discípulos que restaram, embora continuassem acreditando em Daishonin e conduzindo a prática com bravura, não sabiam como refutar as críticas dos ex-seguidores e de outras pessoas da sociedade. Talvez muitos deles se sentissem profundamente frustrados por isso e desejassem ter alguma explicação fundamentada na doutrina budista.

Para dissipar o pessimismo e a dúvida das pessoas e incutir- lhes convicção, era imperativo que Daishonin oferecesse respostas claras aos questionamentos de seus seguidores e das pessoas em geral. A maior parte deste tratado dedica-se a esclarecer essas dúvidas.

Além de referir-se às dúvidas de outros, Daishonin também fala de seus próprios questionamentos. Obviamente, isto não deve ser visto como uma demonstração de vacilação ou falta de fé. Embora todas aquelas pessoas e muitos de seus seguidores tivessem dúvidas, no coração de Daishonin ardia a forte convicção de que somente ele poderia ser o devoto do Sutra de Lótus dos Últimos Dias da Lei.

Mas, se ele realmente era o devoto que dizia ser, tinha de responder uma importante questão pendente: por que as divindades celestiais não se manifestavam para protegê-lo? Tudo indica que as próprias dúvidas de Daishonin estavam centralizadas no juramento feito pelas divindades celestiais de proteger todos os praticantes do Sutra de Lótus.

Estes dois pontos estão inextricavelmente entrelaçados: as dúvidas de Daishonin quanto à falta de proteção por parte das funções celestiais, e as dúvidas dos demais quanto à sua identidade como devoto do Sutra de Lótus.

“Essa dúvida é a questão mais importante de toda a minha existência”

A respeito dessa questão sobre a falta de proteção e sua identidade como devoto do Sutra de Lótus, Daishonin diz: “Essa dúvida representa a essência deste escrito. E (...) é a questão mais importante de toda a minha existência.” Acima das espessas nuvens de dúvidas que cobriam o coração das pessoas se estendia um brilhante céu azul de grande convicção, iluminado pelo Sol que resplandecia serenamente. Ao dissipar essa dúvida, Daishonin também poderia preparar o caminho para revelar “o objeto de devoção em termos de Pessoa”. Por isso, ele diz: “Irei... enfatizá-la mais do que nunca antes de tentar respondê-la.” Ele procura esclarecer totalmente essa dúvida começando por colocá-la em primeiro plano. Sua análise decorrente desse assunto em “Abertura dos olhos” pode ser dividida em duas partes.

N

Na primeira (END, vol. IV, págs. 75-144), ele explica sobre a grande dívida de gratidão que tanto as pessoas dos dois veículos (os ouvintes e os que compreendem a causa) como os bodhisattvas, seres humanos e celestiais, e outras entidades [que agem como funções protetoras ou divindades celestiais] têm para com o Sutra de Lótus, uma vez que só puderam atingir a iluminação pela primeira vez mediante seus ensinos. Ele então enfatiza deliberadamente as dúvidas das pessoas em geral: será que a razão de as divindades celestiais não protegerem Daishonin é porque ele não é o devoto do sutra?

Embora dê a impressão de reforçar essa dúvida, na realidade o que Daishonin faz é analisar em profundidade a verdadeira natureza da proteção oferecida pelas divindades celestiais. É a dívida de gratidão para com o Sutra de Lótus, o ensino por meio do qual podem atingir a iluminação, o que as move a proteger os devotos do sutra. Daishonin também esclarece que um devoto do Sutra de Lótus, em essência, é uma pessoa que pratica o ensino para atingir o estado de Buda.

Na segunda parte (END, vol. IV, págs. 144-201), Daishonin enfoca outros pontos, como as três exortações do 11º capítulo do Sutra de Lótus, “Surgimento da Torre de Tesouro”, nas quais o Buda Sakyamuni exorta três vezes aos bodhisattvas ali reunidos a propagarem o sutra depois de sua morte; as duas admoestações do 12º capítulo, “Devadatta”, nas quais Sakyamuni ensina sobre a iluminação de todas as pessoas; e o verso de vinte linhas do 13º capítulo, “Devoção Encorajadora”, que descreve os três poderosos inimigos (que atacam o devoto do sutra na era maléfica posterior à morte do Buda).

No decorrer dessa análise, Daishonin mostra que ele próprio está praticando em total conformidade com o sutra. Em outras palavras, está lendo o Sutra de Lótus com sua própria vida. Ao mesmo tempo, também revela “a horrível face” das ações contra a Lei que proliferam em toda a nação e que obstruem a propagação do Sutra de Lótus, o ensino para atingir a iluminação (END, vol. IV, pág. 144). Daishonin então reitera sua convicção de ser o devoto do Sutra de Lótus, fundamentando-se nos trechos desse sutra. Mas, devido à aparente ausência de proteção das divindades celestiais, volta a expor sua própria dúvida.

Ele apresenta em seguida respostas para esse questionamento a partir de vários pontos de vista. Gostaria de deixar uma análise mais profunda desta segunda parte para uma outra outra ocasião. Por ora, acredito ser suficiente mencionar a explicação essencial de Daishonin: que as funções celestiais não o estavam protegendo porque abandonaram a nação, devido às calúnias ou atos contra a Lei cometidos pelas pessoas.

Contudo, esta continua sendo uma explicação parcial. A resposta correta se encontra na seguinte passagem que revela o grande juramento: “Declaro aqui que não importa que os deuses me abandonem. Não importa que eu tenha de enfrentar todas as perseguições. Ainda assim, darei minha vida em prol da Lei.” (END, vol. IV, pág. 200.) Em outras palavras, o importante não é se uma pessoa conta ou não com a proteção das funções celestiais. O verdadeiro devoto do Sutra de Lótus é aquele que sustenta o grande desejo do Kossen-rufu, mesmo enfrentando os mais terríveis obstáculos, e que se empenha sem descanso para conduzir as pessoas à iluminação, em uma terra repleta de atos contra a Lei.

Na segunda parte, fica claro que o devoto do Sutra de Lótus enfrenta grandes perseguições por ser uma pessoa que combate corajosamente os atos contra a Lei, o ensino para se atingir o estado de Buda. Um devoto autêntico também desfruta a verdadeira proteção das divindades celestiais. Gostaria de retomar essa questão mais adiante, depois de desenvolver a primeira parte desta análise.

A grande dívida que as pessoas dos dois veículos têm com o Sutra de Lótus

Na primeira parte de sua análise, Daishonin começa esclarecendo que as pessoas dos dois veículos, junto com os bodhisattvas e os seres humanos e celestiais, têm uma grande dívida com o Sutra de Lótus. Isto porque somente quando Sakyamuni finalmente expôs o Sutra de Lótus puderam atingir a iluminação pela primeira vez. Para saldar sua imensa dívida de gratidão, juram na presença de Sakyamuni proteger aqueles que praticam o Sutra de Lótus. Por isso, Daishonin declara que eles, naturalmente, virão em auxílio do devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei.

Daishonin então fala da importância de retribuir ou saldar as dívidas de gratidão (END, vol. IV, pág. 76 em diante). Diz que esse gesto demonstra a virtude humana mais nobre. O oposto, os que não reconhecem suas dívidas, sem falta se desviarão do caminho que deveriam seguir como seres humanos. A luz do humanismo genuíno resplandece no desafio de reconhecer e saldar as dívidas de gratidão. Daishonin afirma que é impossível que as pessoas dos dois veículos, os bodhisattvas, os seres celestiais e as demais entidades que ouviram Sakyamuni pregar o Sutra de Lótus tenham esquecido sua grande dívida de gratidão para com este ensino.

O primeiro grupo que Daishonin examina são as pessoas dos dois veículos. Ele compara os ensinos provisórios, pré- Sutra de Lótus, com o Sutra de Lótus. Os primeiros desqualificam as pessoas dos dois veículos dizendo que são incapazes de atingir o estado de Buda, enquanto o Sutra de Lótus lhes possibilita isso.

Nos ensinos pré-Sutra de Lótus, Sakyamuni adverte rigorosamente os ouvintes. Para ilustrar como era severa essa admoestação, Daishonin diz que quando o venerável Mahakashyapa, um dos discípulos ouvintes, soube que não podia atingir a iluminação, seus lamentos e prantos ecoaram por todo o sistema de grandes mundos. (END, vol. IV, pág. 81.) Mas, na realidade, a repreensão de Sakyamuni devia-se à sua grande benevolência, própria de um buda. As pessoas dos dois veículos haviam se esquecido da importância de beneficiar os semelhantes, e a única coisa que lhes interessava era beneficiar a si próprios. Sakyamuni, portanto, queria ajudá- los a se libertar de sua escuridão interior e da ilusão.

No Sutra de Lótus, os ouvintes adquirem o “remédio da imortalidade” (END, vol. IV, pág. 77). Sua incapacidade de atingir o estado de Buda, nos ensinos pré-Sutra de Lótus, equivalia à “morte” como praticantes budistas. Porém, no Sutra de Lótus, eles transcendem o ensino Hinayana da “redução do corpo a cinzas e a aniquilação da consciência” para atingir o nirvana, e por fim, obter a sabedoria da Lei Mística. Com isso, eles renascem como praticantes budistas e, por essa razão, dizem que o Sutra de Lótus é o “remédio da imortalidade”.

No Sutra de Lótus, os quatro grandes ouvintes,2 ao saberem da profecia de sua iluminação, formulam o seguinte juramento: “Agora, nos tornamos os verdadeiros ouvintes, pois propagaremos a voz do caminho do Buda e faremos com que seja ouvida por todos.” (The Lotus Sutra [LS4], pág. 94; END, vol. IV, pág. 80.) Transcendendo sua identidade anterior, ou seja, a de pessoas que ouviam superficialmente a voz do Buda e que tinham uma vaga compreensão do que ele dizia, conseguiram captar profundamente a sabedoria do Buda. Declaram ainda que a partir daquele momento, lutariam como verdadeiros ouvintes a fim de possibilitar a todas as pessoas ouvirem a voz do Buda. Isso indica seu renascimento como bodhisattvas.

O juramento que eles fazem é o de lutar juntos, em unicidade com seu mestre. Abandonam sua postura egocêntrica, centrada apenas em libertar-se do próprio sofrimento e se lançam a um domínio tão vasto e ilimitado quanto o firmamento, onde se dedicam a possibilitar a todos os seres atingirem a iluminação. Nesse mesmo trecho do sutra, eles também enfatizam repetidamente que sua dívida com o Sutra de Lótus é tão grande que eles não têm esperança de saldá-la jamais. (LS4, pág. 95; END, vol. IV, págs. 80-81.)

Daishonin assegura que as pessoas dos dois veículos adquiriram a visão do Buda e a visão do Darma, que lhes possibilita ver todos os mundos das dez direções. Como, então, deixariam de ver um devoto do Sutra de Lótus neste mundo saha cheio de conflitos? (END, vol. IV, pág. 79.) Se esse devoto existisse nos Últimos Dias da Lei, ele diz, sem falta, esses sábios estariam ao seu lado e lutariam para protegê-lo, mesmo que tivessem de atravessar um grande incêndio por ele. (END, pág. 88.) De outro modo, a predição do Sutra de Lótus sobre a ampla propagação no último período de quinhentos anos3 depois da morte do Buda seria “mera tolice”. (END, vol. IV, pág. 88.)

Daishonin imediatamente pergunta por que, apesar de tudo isso, as pessoas dos dois veículos do Sutra de Lótus não protegem seu devoto nos momentos de perseguição. Por acaso seriam aliados dos que agem contra a Lei, ele se pergunta. Enquanto os censura rigorosamente por sua passividade, ao mesmo tempo indaga a si próprio várias vezes: por que não tem recebido sua proteção? E conclui com as seguintes palavras: “Minhas dúvidas nunca foram tão grandes.” (END, vol. IV, pág. 89.)

A grande dívida que os bodhisattvas e os seres celestiais e humanos têm para com o Sutra de Lótus

A seguir, Daishonin analisa a grande dívida que os bodhisattvas e os seres celestiais e humanos têm para com o Sutra de Lótus. (END, vol. IV, pág. 89 em diante.)

Embora volte a expor as diferenças entre os ensinos pré-Sutra de Lótus e este sutra, ele também esclarece as doutrinas expostas neste, o ensino para atingir o estado de Buda. Analisa especificamente a doutrina da possessão mútua dos Dez Mundos,4 que consta no 2º capítulo, “Meios”, e a doutrina sobre a verdadeira iluminação de Sakyamuni no remoto passado, elucidada no 16º capítulo, “Revelação da Vida Eterna do Buda”. Em seguida, explica a grande dívida de gratidão que os bodhisattvas e os seres celestiais e humanos têm para com o Sutra de Lótus por atingirem a iluminação mediante este ensino.

Daishonin observa que nenhum dos bodhisattvas que apareceram nos ensinos anteriores ao Sutra de Lótus era discípulo de Sakyamuni. Por exemplo, os bodhisattvas mencionados no Sutra Guirlanda de Flores haviam viajado das terras do Buda das dez direções para se reunirem ante Sakyamuni, logo depois de ele ter atingido a iluminação pela primeira vez, debaixo da árvore bodhi, na Índia. Mas eles não eram discípulos seus. Além disso, Daishonin diz que, nos ensinos prévios ao Sutra de Lótus, Sakyamuni não expôs nenhuma doutrina superior às que esses bodhisattvas pregavam.

No Sutra de Lótus, esses bodhisattvas unem as palmas das mãos em sinal de reverência a Sakyamuni e solicitam ouvir o “ensino dotado de perfeição”. (LS2, pág. 28; END, vol. IV, pág. 94.) Daishonin explica que o “ensino dotado de perfeição” significa a doutrina da possessão mútua dos Dez Mundos, e que esta não é outra senão o Nam-myoho-rengue-kyo. Ele diz: “Na frase ‘dotado de perfeição’, a palavra ‘dotado’ refere-se à possessão mútua dos dez estados, ao passo que ‘perfeito’ significa que, uma vez que existe a possessão mútua dos dez estados, quaisquer desses estados contêm todos os demais, indicando que isso é ‘perfeito’.” (END, vol. IV, pág. 97.)

Mediante a possessão mútua dos Dez Mundos, torna-se claro que cada um dos dez estados manifesta seu próprio estado de Buda, e que todas as pessoas igualmente têm o potencial para atingir a iluminação. A respeito do trecho do capítulo “Meios”, “Os budas desejam abrir o portal da sabedoria do Buda para todos os seres vivos” (LS2, pág. 31; END, vol. IV, págs. 97-98), Daishonin diz: “A frase ‘todos os seres vivos’ refere-se a Shariputra e também aos icchantika, que são as pessoas de descrença incorrigível. Essa frase também se refere aos nove estados.” (END, vol. IV, pág. 98.) Daishonin diz claramente que não foi somente o ouvinte Shariputra o único a atingir a iluminação mediante o ensino dotado de perfeição, mas também o foram todos os seres dos nove mundos, incluindo as pessoas de descrença incorrigível.

Ele também esclarece que, ao abrir o caminho para que todas as pessoas atinjam a iluminação, Sakyamuni cumpriu seu juramento de “salvar inúmeros seres vivos”,5 e enfatiza que todos os bodhisattvas e seres celestiais entenderam que haviam escutado pela primeira vez a doutrina insuperável dos três mil mundos num único momento da vida, contida no Sutra de Lótus. (END, vol. IV, pág. 99.)

Já nesse estágio da pregação do Sutra de Lótus de Sakyamuni, os bodhisattvas têm razões suficientes para considerar o sutra como o ensino supremo. Porém, a grande dívida que eles têm para com esse ensino só se manifesta em sua totalidade quando Sakyamuni expõe, no capítulo “Revelação da Vida Eterna do Buda”, que, na realidade, atingiu a iluminação no remoto passado. Essa declaração indica que todos os demais budas que apareciam nos outros sutras eram incorporações de Sakyamuni. Conseqüentemente, os bodhisattvas discípulos desses budas eram, em última análise, discípulos de Sakyamuni. (END, vol. IV, pág. 128.)

Portanto, no capítulo “Revelação da Vida Eterna do Buda” todos os budas dos ensinos pré-Sutra de Lótus se unificam em um só Buda que, na realidade, atingiu a iluminação no remoto passado. Também torna-se evidente que Sakyamuni, que atingiu a iluminação no remoto passado, é o Buda que pode ser considerado mestre de todos os bodhisattvas que aspiram à iluminação.

O Buda que atingiu a iluminação no remoto passado é o Buda eterno, inseparável da Lei Mística eterna. Esse Buda é a verdadeira identidade de Sakyamuni que viveu na Índia antiga. Esse fato indica que todas as pessoas podem fazer surgir em sua própria vida o poder da Lei Mística eterna, a Lei fundamental do Universo. Um buda é uma pessoa que ativa em si mesma o poder da Lei Mística eterna; um buda é Myoho-rengue-kyo. E Myoho-rengue-kyo é a verdadeira essência do Buda; é o Buda original.

Entre todos os sutras expostos por Sakyamuni, a Lei Mística eterna é revelada pela primeira vez como a semente da iluminação no ensino do capítulo “Revelação da Vida Eterna do Buda” (ou seja, a iluminação real de Sakyamuni no remoto passado). O Buda do capítulo “Revelação da Vida Eterna do Buda” é Myoho-rengue-kyo, que é a verdadeira essência do Buda. E Myoho-rengue-kyo é a Lei da vida inerente a todas as pessoas; é a semente para que todos atinjam a iluminação. Esta semente está oculta nas profundezas do capítulo “Revelação da Vida Eterna do Buda”. Por isso, este capítulo é o ensino supremo entre todos os sutras. Daishonin enaltece esse capítulo do seguinte modo: “Se entre todos os inúmeros sutras faltasse este capítulo ‘Revelação da Vida Eterna do Buda’, isso seria como se nem o Sol nem a Lua existissem, como uma nação sem soberano, como montanhas e rios sem pedras preciosas e como seres humanos sem espírito.” (END, vol. IV, pág. 129.)

Por esse motivo, todos os bodhisattvas que aspiram atingir a iluminação deveriam sentir a mais profunda gratidão para com o Sutra de Lótus.

Aqueles que não reconhecem suas dívidas de gratidão não passam de “animais talentosos”

Os inúmeros budas, bodhisattvas e seres humanos e celestiais descritos nos sutras que precederam o Sutra de Lótus parecem ter atingido a iluminação por meio dos sutras em que eles particularmente aparecem. Entretanto, na verdade, eles atingiram iluminação somente por meio do Sutra de Lótus. O juramento geral que Sakyamuni e os outros budas fizeram de salvar os incontáveis seres é cumprido por meio do Sutra de Lótus. Esse é o significado da passagem do sutra que afirma que o juramento “foi finalmente cumprido”. (LS2, pág. 36.)

À luz desses fatos, acredito que os devotos e seguidores dos sutras Guirlanda de Flores, da Meditação, Mahavairochana, entre outros, serão infalivelmente protegidos pelos budas, bodhisattvas e seres celestiais dos respectivos sutras que eles crêem. Porém, se os devotos dos sutras Mahavairochana, da Meditação, entre outros, posicionarem-se como inimigos do devoto do Sutra de Lótus, então, os budas, bodhisattvas e os seres celestiais abandonarão todos eles e protegerão somente o devoto do Sutra de Lótus. (...)

Eu, Nitiren, tenho a seguinte opinião: os deuses do Sol e da Lua e as outras divindades estavam presentes nos dois locais e nas três assembléias6 em que o Sutra de Lótus foi pregado. Se um devoto do Sutra de Lótus fizer seu advento, assim como o ferro é atraído pelo ímã ou a Lua reflete sua imagem na superfície da água, todos eles aparecerão imediatamente para tomar os sofrimentos do devoto para eles próprios, cumprindo o juramento que fizeram diante do Buda. Porém, eles ainda não apareceram para me proteger. Será que isso significa que eu não sou o devoto do Sutra de Lótus? Caso eu não seja, devo então examinar novamente o texto do sutra de acordo com minha conduta e encontrar meu erro. (END, vol. IV, págs. 141-143.)

As diversas escolas budistas da época de Daishonin não compreendiam nem reconheciam que, entre os muitos ensinos de Sakyamuni, o Buda do capítulo “Revelação da Vida Eterna do Buda” era aquele que deviam considerar como objeto de devoção em sua prática budista para atingir a iluminação. Eles não só ignoravam isso como também interpretavam arbitrariamente o verdadeiro ensino do Buda, distorcendo- o e colaborando para ocultá-lo ainda mais.

Uma das características dessa época, os Últimos Dias da Lei, é o surgimento de monges para obscurecer o ensino correto. Conseqüentemente, a verdade do Sutra de Lótus perdese de vista. E, por fim, as diversas escolas budistas tornamse confusas quanto ao objeto de devoção.

Daishonin refuta rigorosamente os conceitos defendidos pelas escolas de sua época sobre o objeto de devoção e a consecução do estado de Buda. Declara que elas haviam se afastado da verdade e que falharam em reconhecer o Buda fundamental expos

A

to no capítulo “Revelação da Vida Eterna do Buda”, que possui

a semente da iluminação. Ele compara essas escolas budistas errôneas

ao herdeiro do soberano de uma nação que, confuso em

relação à identidade de seu pai, repudia-o e acredita que outra

pessoa é o rei verdadeiro. (END, pág. 133.) Como o filho que

não reconhece o próprio pai, os seguidores dessas escolas, ignorantes

do Buda do capítulo “Revelação da Vida Eterna do Buda”,

“não sabem quem são as pessoas com as quais têm dívidas

de gratidão”. (END, vol. IV, págs. 133-134.) Embora aparentem

ser bem versados no budismo, Daishonin os denuncia dizendo

que são meros “animais talentosos”. (END, vol. IV, pág. 134.)

Voltando ao nosso tema principal, as funções celestiais

que protegem o Sutra de Lótus, Daishonin expressa sua

convicção de que os bodhisattvas que atingiram a iluminação

ouvindo o Sutra de Lótus certamente se manifestariam

de imediato para proteger o devoto desse sutra, em seu desejo

de cumprir o juramento feito na presença do Buda.

(END, vol. IV, pág. 143.) No entanto, se assim fosse, por

que eles não apareceram para protegê-lo? Para resumir a

primeira parte, Daishonin enfatiza uma vez mais sua dúvida,

dizendo: “Será que isso significa que eu não sou o devoto

do Sutra de Lótus?” (END, vol. IV, pág. 143.) E acrescenta:

“Caso eu não seja, devo então examinar novamente

o texto do sutra de acordo com minha conduta e encontrar

meu erro.” (END, vol. IV, pág. 143.) Dessa forma, ele dispõe

o cenário para a próxima parte de sua análise [a qual

entrarei em detalhes em outra ocasião].

“O objeto de devoção é a entidade

da vida do devoto do Sutra de Lótus”

A análise de Daishonin na primeira parte tem como foco a

promessa de proteção, feita pelas pessoas dos dois veículos,

pelos bodhisattvas e outras entidades, aos praticantes do Sutra

de Lótus, por terem escutado pela primeira vez o ensino

para atingir o estado de Buda no Sutra de Lótus. Podemos deduzir

que seu propósito é ressaltar que as funções protetoras

do Universo são ativadas mediante o poder da Lei Mística, o

ensino para atingir o estado de Buda.

Em outras palavras, a natureza fundamental da iluminação7 manifesta-se como funções protetoras do Universo, também chamadas “divindades budistas”. Por isso, dizem que estas divindades abandonam a terra onde prevalecem os atos contra a Lei. Porém, mesmo em uma época corrupta em que essas ações proliferam, se houver um devoto do Sutra de Lótus que protege a Lei Mística e a propaga, as funções universais não deixarão de proteger essa pessoa.

Por mais obscura que seja a época, as funções protetoras do Universo irão ao encontro daquele que luta pelo bem do budismo e o protegerão rigorosamente. Isto por que essa pessoa é abraçada pela Lei Mística pelas três existências do passado, presente e futuro, e por ser uma entidade una com a Lei.

Ao analisar a proteção estendida às pessoas dos dois veículos, aos bodhisattvas e demais entidades, Daishonin expressa sua convicção de que o devoto do Sutra de Lótus é alguém que pratica a Lei Mística, o ensino para a consecução do estado de Buda, e que combate os atos contra a Lei.

Nos Últimos Dias, a Lei Mística se manifesta somente na vida do devoto do Sutra de Lótus. Tanto a doutrina da possessão mútua dos Dez Mundos (revelada no capítulo “Meios”) como a Lei Mística, que é a semente da iluminação (elucidada na explanação da iluminação real do Buda no remoto passado no capítulo “Revelação da Vida Eterna do Buda”) não existem em nenhum outro lugar senão na vida do devoto do Sutra de Lótus.

Em Registro dos Ensinos Orais, Daishonin diz: “O objeto de devoção é, portanto, a entidade da vida inteira do devoto do Sutra de Lótus.”8 Podemos encontrar o objeto de devoção, que serve como um espelho e um guia em nossa prática para atingir a iluminação, na vida do devoto do Sutra de Lótus. Por isso, Daishonin diz sobre essas perguntas referentes à proteção das divindades celestiais e a identidade do devoto do Sutra de Lótus: “Essa dúvida representa a essência deste escrito. E (...) é a questão mais importante de toda a minha existência.” (END, pág. 77.) Por isso é dito que “Abertura dos olhos” revela o “objeto de devoção em termos de Pessoa”. (Daibyakurengue, edição de dezembro de 2004.)

Compartilhar nas