marcar-conteudoAcessibilidade
Tamanho do texto: A+ | A-
Contraste
Encontro com o Mestre

9.3 O budismo origina-se da luta interior de Shakyamuni

ícone de compartilhamento

20/06/2015

9.3 O budismo origina-se da luta interior de Shakyamuni
INTRODUÇÃO

No romance Nova Revolução Humana, o presidente Ikeda descreve o despertar de Shakyamuni em relação à eternidade da vida, após perceber que as práticas austeras extremas não constituem o caminho para a iluminação. Seu despertar é o drama da vitória sobre a escuridão ou ignorância fundamental — a ação de funções demoníacas internas — que consiste na forma suprema de vitória no budismo.

Discurso do presidente Ikeda

extraído da obra Nova Revolução Humana, volume 3, capítulo “O Buda”.

Shakyamuni prosseguiu sua meditação sob a árvore bodhi.

Segundo os textos budistas, nessa ocasião, os demônios começaram a tentá-lo. Os meios desonestos de que eles se valeram diferem de um escrito para outro, mas é interessante observar que alguns dos recursos utilizados envolviam palavras de aparente gentileza e preocupação.

Numa descrição, por exemplo, um demônio tentou influenciar Shakyamuni sussurrando-lhe suavemente: “Veja como está magro, como seu rosto está pálido. Com certeza, deve estar à beira da morte. Se continuar sentado aqui desse jeito, será um milagre sobreviver”.

Depois de apontar o perigo que ele estava correndo e insistir fortemente para que vivesse, o demônio tentou persuadir Shakyamuni de que se seguisse os ensinos do bramanismo, poderia acumular benefícios grandiosos sem ter de passar por tais sofrimentos. Os esforços de Shakyamuni para atingir a iluminação não tinham sentido, declarou o demônio.

O apelo do demônio nesse contexto podem ser acatados como uma expressão da luta feroz que estava se desenrolando dentro da mente de Shakyamuni naquele momento.

A dúvida o assaltava, esfacelando sua paz interior e tumultuando sua mente. Com o corpo extremamente fraco e sua resistência física praticamente esgotada, o pavor da morte deve ter crescido em seu coração. O tormento mental de Shakyamuni era ainda maior pois, sabendo que não ganhara nada com as austeridades intensas a que havia se submetido, começou a duvidar e a temer que seus esforços para atingir a iluminação no fim também se mostrassem inúteis.

Ele fora assaltado simultaneamente pelos desejos mundanos, pela fome, pelo desejo de dormir e também pelo medo e pela dúvida.

Demônios e forças diabólicas representam as ações dos desejos mundanos e das ilusões tentando abalar a mente daqueles que buscam o caminho da verdadeira iluminação. Algumas vezes, os demônios assumem a forma de apegos a desejos mundanos, ou da manifestação física da fome ou sono. Outras vezes, eles torturam a mente na forma de ansiedade, medo e dúvida.

Sempre que as pessoas são desencaminhadas por essas funções demoníacas, invariavelmente justificam suas falhas de algum modo. Além disso, elas se convencem de que seus pretextos são perfeitamente razoáveis e naturais.

Por exemplo, como na época de Shakyamuni ninguém ainda havia alcançado a iluminação, talvez lhe parecesse bastante razoável questionar se sua meditação sob a árvore bodhi se mostraria inútil no fim.

Na maior parte das vezes, as funções demoníacas levam as pessoas a se agarrar a alguma conclusão aparentemente sensata que justifique as suas fraquezas e necessidades emocionais. Nichiren Daishonin adverte sobre o fato, citando as palavras: “O demônio zelará por ele como um pai” (WND, v. I, p. 770).

Shakyamuni, porém, enxergou a real natureza dessas funções demoníacas e reuniu uma poderosa energia vital, afastando todos os pensamentos geradores de confusão que importunavam sua mente. Ele bradou em seu coração: “Demônios! Vocês podem vencer um covarde, mas o bravo triunfará! Lutarei! Em vez de ceder à derrota, prefiro morrer lutando!”

Com isso, sua mente voltou a um estado de tranquilidade. O sereno véu da noite o envolveu, enquanto incontáveis estrelas cintilavam no alto com um brilho puro e cristalino.

Depois de vencer o ataque das forças demoníacas, a mente de Shakyamuni ganhou novo ânimo e vitalidade, seu espírito tornou-se tão límpido como o céu azul.

Desse modo, ele despertou para a natureza eterna da vida, que se estende pelo passado, presente e futuro. Naquele instante, todos os medos e dúvidas fortemente sedimentados nas profundezas de sua vida desde o nascimento evaporaram. Ele finalmente tinha chegado à raiz profunda e imperturbável de sua própria existência.

Ele sentiu a escuridão da ilusão desaparecer quando a radiante luz da sabedoria iluminou a sua vida. Tinha liberado dentro dele uma condição existencial semelhante à visão clara e desimpedida, em todas as direções, que se tem no topo de uma elevada montanha.

Durante um tempo, Shakyamuni simplesmente deleitou-se com o sabor de ter despertado para a verdade — a lei fundamental da vida e do universo — mas logo começou a se sentir cada vez mais aflito. Estava enfrentando um dilema: deveria pregar essa Lei aos outros ou permanecer em silêncio? Sentado à sombra da árvore bodhi, torturou-se por vários dias com tal dúvida.

Ninguém jamais ouvira falar, muito menos explanado, essa Lei magnificente e inigualável. Havia uma lacuna imensa entre o reino resplandecente do interior de seu ser e o mundo real externo.

As pessoas viviam atormentadas, temendo a doença, a velhice e a morte. Consumidas pelo desejo, brigavam constantemente umas com as outras. Tudo se devia à ignorância delas acerca da lei da vida. Mesmo, porém, que lhes ensinasse a Lei em benefício delas próprias, talvez ninguém a compreendesse.

Shakyamuni sentiu-se completamente só. Era a solidão dos seres genuinamente iluminados, algo que somente aqueles que obtiveram a compreensão sobre um princípio profundo, do qual ninguém mais tem consciência, conhecem.

Um relato descreve a reaparição de demônios nesse momento para atormentar Shakyamuni. O episódio pode, novamente, ser interpretado como uma luta contra as funções demoníacas de sua própria vida, que agora tentavam dissuadi-lo de ensinar a Lei às outras pessoas.

Shakyamuni não conseguia conter esse surto de dúvida e hesitação diante da ideia de seguir em frente e disseminar a Lei. A decisão sobre o que fazer o mortificava.

As funções demoníacas continuaram, portanto, a afligir Shakyamuni, mesmo após ele ter se tornado buda. Elas competiam entre si para atacá-lo através da mínima brecha que encontrassem em seu coração.

Um buda não é um ser sobre-humano. Aquele que alcança esse estado continua a vivenciar problemas, sofrimentos e dor, e ainda está sujeito a doenças e a ser tentado pelas forças demoníacas. Por essa razão, buda é uma pessoa dotada de coragem, tenacidade e ação constante, que luta incessantemente contra as funções demoníacas.

Por mais elevado que seja o estado alcançado por nós, sem esforços persistentes para avançar e nos aprimorar, nossa fé pode ser destruída num instante.

Segundo um texto budista, o deus Brahma surgiu diante do ainda indeciso Shakyamuni e rogou-lhe que pregasse a Lei a todas as pessoas. Esse episódio simboliza a poderosa determinação que brotou da vida de Shakyamuni de prosseguir e cumprir sua missão.

“Seguirei adiante!”, decidira peremptoriamente. “Aqueles que buscam aprender, com certeza ouvirão. Aqueles com poucas impurezas compreenderão. Sairei em meio às pessoas, tão envoltas pela desilusão e ignorância!”

Uma vez tomada a decisão, sentiu uma nova onda de energia fluir dentro dele. Nesse momento, o grande leão levantou-se pela felicidade da humanidade.

Compartilhar nas