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Na prática

Fé: A preciosa joia do coração

“Fé” é um tema muito comum e um dos fundamentos básicos das práticas religiosas. Com o budismo não é diferente. No Budismo Nichiren, fé, como veremos nesta matéria, é pura, profunda e verdadeiramente transformadora. O buda Nichiren Daishonin escreveu: “Empenhe-se nos dois caminhos da prática e do estudo. Sem prática e estudo não pode haver budismo. Deve não só perseverar como também ensinar aos outros. Tanto a prática como o estudo surgem da fé” (CEND, v. I, p. 405-406). Nesse sentido, “prática” corresponde à ação concreta, “estudo” é a aprendizagem dos ensinamentos budistas e “fé” significa acreditar e abraçar os ensinamentos do Buda. Então, vamos nos aprofundar no conceito de “fé” entendido no âmbito do budismo da Soka Gakkai e em como pôr a fé em prática.

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17/08/2019

Fé: A preciosa joia do coração

Fé pura como amizade de infância

Era segunda-feira de manhã, e a pequena Tais comia torradas enquanto sua mãe terminava de arrumar sua mochila. “Lápis de cor, caderno, apontador... acho que está tudo pronto”, pensava a mãe como quem estivesse fazendo um check-list para uma missão secreta. De fato, era o início de uma importante missão, pois Tais teria o primeiro dia de aula na escola de educação infantil.

Depois de tomar o café da manhã, a menina colocou a mochila nas costas e, acompanhada da mãe, foi à escolinha. Lá, notou que havia um monte de gente desconhecida. Quando entraram na sala de aula, viu muitas crianças tímidas e uma moça que recebia todos com um grande sorriso — era a professora Katia.

A professora deu as boas-vindas a Tais e a acompanhou para sentar-se ao lado de outra garota da mesma idade, Polyana.

O sinal da escola tocou, indicando o início da aula, e logo Katia solicitou a cada aluno que desenhasse sua família. Polyana não tinha lápis de cor, mas isso não foi um problema, pois prontamente Tais lhe emprestou os seus. E logo começaram a cultivar uma bela e inocente história de cumplicidade.

Assim como a amizade cultivada na infância, a fé adquirida na Soka Gakkai é simples e espontânea. Nichiren Daishonin afirma: “O que chamamos de fé não é nada fora do comum” (CEND, v. II, p. 304). A fé é um sentimento puro e sincero que existe dentro do coração de cada pessoa.

A palavra japonesa para designar “fé”, usada na Soka Gakkai, se escreve com dois ideogramas. O primeiro significa “crença”, e o segundo, “coração”. Dessa forma, juntos formam a palavra shinjin, que pode ser compreendida como “coração puro de inabalável crença”, mas em tradução literal quer dizer “fé”.

Alguns podem pensar que ter coração puro seja algo extraordinário. No entanto, para manifestar a pureza do coração basta ser honesto consigo. Se analisarmos a história da pequena Tais, não há nada de incomum em uma amizade começar a partir de um lápis emprestado. Ao contrário, é uma cena bastante corriqueira. Mas por que é tão simples fazer amigos dessa maneira durante a infância? As crianças são sinceras, não querem impressionar ninguém. Da mesma forma, a fé verdadeira deve possuir essa mesma pureza e sinceridade.

 

A joia escondida no manto

Quando nos tornamos adultos, surgem muitas questões — responsabilidade financeira, trabalho, cuidados com a saúde, família. Às vezes, algumas dessas questões nos causam sofrimentos. Fazemos de tudo para resolvê-las e, não raro, elas se tornam o centro da nossa vida. Mas, independentemente do problema que esteja enfrentando, esforce-se para não permitir que ele o distraia da essência que existe em seu coração. Mesmo que por vezes se esqueça disso, você carrega um tesouro precioso consigo.

No Sutra do Lótus consta a parábola da joia escondida no manto: 1

Certa vez, um hospedeiro recebeu a visita de um amigo de longa data. O visitante que era um andarilho dos mais viajados olhou com carinho para seu hospedeiro. Os dois eram amigos muito íntimos, mas o tempo, o trabalho e outros assuntos mundanos, aos poucos, fizeram com que se distanciassem.

Enfim, a distância terminou e os dois felizes companheiros celebraram o reencontro com uma refeição suntuosa e muito vinho. Passaram o dia festejando, mas, agora que a noite chegara, o visitante estava tão embriagado pelo vinho que a única coisa a fazer era fechar os olhos e dormir.

Enquanto o visitante descansava pesadamente, o hospedeiro teve de atender um importante e inadiável chamado. Antes, porém, preocupado com o bem-estar do amigo, escolheu sua joia mais preciosa e costurou-a sob o manto do visitante.

Pensou: “Quando ele acordar pela manhã, certamente ainda estará bem sonolento. Verá que eu tive de partir e ficará desapontado. Porém, quando vir esta preciosa joia compreenderá que, a despeito da minha rude e apressada partida, eu o amo profundamente e lhe desejo o melhor. Colocando a joia sob sua roupa, ele a levará sem falha. Se a colocar em outro lugar, talvez ele não a perceba ou a esqueça”.

Pela manhã, o visitante, ainda “grogue”, olhou em volta e ficou decepcionado por não ver o amigo. Com pesar, vestiu a roupa e foi seguindo seu caminho sem perceber a joia escondida em seu manto. Por muito tempo vagou percorrendo estradas arenosas e inúmeros países numa constante luta pela sobrevivência. Trabalhou duramente sem a mínima ideia da riqueza que levava consigo.

Um dia, os dois amigos se encontraram novamente. O hospedeiro ficou chocado com a aparência do amigo e perguntou-lhe com compaixão:

“Por que você se tornou tão pobre e miserável? Quando me visitou, costurei a mais preciosa das joias nas dobras da sua roupa, de modo que pudesse viver uma vida digna. Mas você não sabia disso e passou seus dias tentando sobreviver, levando esta vida lastimável. Deve usar imediatamente essa joia e mudar sua condição de vida. Então terá tudo que almeja”.

Pela primeira vez, o visitante compreendeu o grande tesouro que seu amigo havia lhe dado. Seu ser iluminou-se de alegria e lágrimas deslizaram por sua face.

Na parábola, a joia de valor inestimável representa a natureza de buda inerente à vida de todas as pessoas. Apesar de, na história, a joia ter sido presenteada por alguém, no nosso caso, já nascemos com a natureza de buda dentro de nós.

Perdido nos sofrimentos causados pelos desejos mundanos, o viajante passou anos sem enxergar que carregava consigo um grande tesouro, até reencontrar seu amigo, que o avisou. Nós despertamos para essa verdade em nossa vida por meio dos incentivos do Ikeda sensei e da recitação do daimoku.

A fé no budismo consiste em acreditar de maneira profunda que você, assim como todos ao redor, possui o estado de buda inerente em sua vida, e pode manifestá-lo a todo instante, independentemente das circunstâncias que enfrenta, por meio da prática.

No entanto, quantas vezes passamos por sofrimentos causados pelos desejos mundanos e nos esquecemos de que temos esse potencial ilimitado em nossa vida? O segredo para não cometermos o mesmo erro do viajante é realizarmos a prática da fé. Recitar Nam-myoho-renge-kyo é um exercício que fortalece o coração e desperta a mais elevada condição de vida. Comprovando esse ponto, você naturalmente aprofunda sua fé.

 

“A razão aprofunda a fé”

O segundo presidente da Soka Gakkai, Josei Toda, costumava dizer: “A fé busca a razão, e a razão aprofunda a fé”. Nesse contexto, “razão” pode ser entendida como “lógica”. Culturalmente somos levados a acreditar que fé e lógica são coisas distintas, e por vezes até contraditórias. No entanto, esse raciocínio não faz sentido no budismo. O presidente Ikeda afirma:

 

Com base em minha experiência, a fé se aprofunda mediante o esclarecimento de questionamentos e dúvidas, e a reflexão contínua e intensa sobre tais indagações no curso da prática budista, até finalmente obtermos uma resposta satisfatória que possamos aceitar de todo o coração. Em Registro dos Ensinamentos Transmitidos Oralmente (Ongi Kuden), Daishonin enuncia: “Sem fé não pode haver compreensão, e sem compreensão não pode haver fé”. (OTT, p. 54-55)2

 

Dessa maneira, estudar, esclarecer dúvidas e “pôr à prova” o que se aprende no budismo é saudável e aconselhável. Essas atitudes encorajam o indivíduo a fazer a prática. Ao observar os resultados (o que chamamos de prova real), naturalmente sua fé se aprofundará e se manifestará de forma ainda mais sincera.

 

Não deixe sua fé se abalar por nenhum obstáculo

Certa ocasião uma senhora havia sido desenganada pelos médicos — disseram que não viveria mais que alguns meses. Então, ela decidiu recitar oito horas diárias de daimoku. Passados dois anos sem ter se curado, ela perguntou ao presidente Ikeda: “Mestre, por que, apesar de recitar oito horas de daimoku diariamente durante dois anos consecutivos, ainda não venci minha doença?”. Em resposta, ele a parabenizou por sua coragem e persistência. Entrentanto, solicitou que mudasse seu sentimento por alegria e gratidão, uma vez que se empenhar dessa forma é difícil até mesmo para uma pessoa saudável. Ele percebeu que na pergunta dela havia dúvida (por que), lamentação (apesar de) e cobrança (ainda não).3

A partir da resposta do mestre, ela começou a orar manifestando seu profundo sentimento de gratidão por ter conhecido este budismo e a organização e até mesmo pela doença. Começou a visualizar que estava curada, transformando o carma de doença. Em menos de seis meses já havia recuperado a saúde.

A fé que se manifesta a partir de um coração puro é verdadeiramente transformadora. Quando está nessa condição, a pessoa não é assombrada por dúvidas e medos, manifesta apenas a certeza de que vencerá infalivelmente cada dificuldade. A partir de uma fé inabalável, essa veterana fez brotar esperança em sua vida.

 

Fé não é barganha

No budismo, a fé é a decisão proveniente de um coração sincero, não fazemos promessas nem trocas com entidades divinas. Acreditamos no estado de buda de todas as pessoas, pois não só despertamos um ilimitado potencial dentro de nós, como também passamos a respeitar com sinceridade a dignidade da vida dos demais.

Em conclusão, fé, na Soka Gakkai, significa acreditar, com coração puro e sincero como o de uma criança,  que você e todas as pessoas carregam consigo a preciosa joia do estado de buda e, com isso, transformam profundamente sua realidade. É um sentimento espontâneo e natural, que todas as pessoas têm condições de evidenciá-lo, sem grande cerimônia. Manifestar essa forte fé traz esperança e coragem, ingredientes essenciais para vencer as dificuldades que possamos enfrentar na vida.

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