Na prática
TC
Alcance a revolução humana ao iluminar a vida das pessoas
Redação
03/04/2023
Qual seu o sentimento, quando você acompanha os noticiários que retratam o drama da realidade diária ou quando alguém compartilha seus desafios mais difíceis?
Como praticantes do Budismo Nichiren, destinamos cotidianamente orações pela paz mundial e felicidade de todas as pessoas, e somos estimulados nas atividades da organização e pelas orientações do presidente da SGI, Dr. Daisaku Ikeda, a manifestar um coração benevolente ao encorajar aqueles que passam por severas adversidades.
Em sua Proposta de Paz de 2013, Ikeda sensei revela quão importante é acolher as pessoas que sofrem. Ele diz:1
Para que o respeito à dignidade da vida seja o fundamento de um esforço contínuo, é necessário que as pessoas do mundo inteiro sintam e vivam esse respeito de maneira palpável, em seu próprio modo cotidiano de ser e viver. Proponho três compromissos como guias de ação:
- Ter a capacidade de se alegrar ou de sofrer com os outros.
- Crer nas infinitas possibilidades da vida.
- Defender e celebrar a diversidade.
O primeiro compromisso refere-se à compaixão; o segundo, à sabedoria, o terceiro, à coragem.
Compaixão que nunca abandona os outros no sofrimento.
Sabedoria de perceber a igualdade e as possibilidades da vida.
Coragem de fazer das diferenças o impulso para elevar a nossa humanidade.
Em vista desse direcionamento, a seção Na Prática elucidará o primeiro ponto apresentado por Ikeda sensei, “compaixão”, e compartilhará a visão budista referente à atuação no cotidiano e como esse comportamento impacta a vida pessoal e coletiva.
Ação que transforma
A maioria de nós, certamente, já viveu aquele momento em que está em casa com a família, realizando as atividades cotidianas, e de repente a luz é interrompida. Ficamos no escuro absoluto até que alguém encontre e acenda uma vela, ligue uma lanterna ou a luz do celular. A ação de um familiar ilumina o ambiente e todos são beneficiados.
A escuridão pode nos paralisar por um momento, mas, ao agirmos para clarear o ambiente, iluminamos não apenas o local para os outros, como também para nós. Trazendo a falta de luz para o contexto pessoal, talvez você tenha se desanimado ao passar por grandes desafios e, subitamente, um amigo ou um familiar próximo tenha lhe solicitado que o auxiliasse com urgência em determinada situação. Então, à medida que sua atenção se volta para ajudá-lo, seu ânimo melhora. Em vez de se sentir para baixo, entusiasma-se e se energiza para apoiá-lo. Antes que percebesse, uma perspectiva pode ter se ampliado para a resolução da própria situação. Por que isso acontece?
Quando enfrentamos problemas e adversidades, é muito fácil ficarmos envolvidos em orar somente para nós mesmos. Contudo, ao ouvirmos um relato de sofrimento de uma pessoa, manifestamos quase de imediato o sentimento de empatia. Colocamo-nos no lugar dela, sentimos sua angústia e nos solidarizamos com seu sofrimento. Por vezes, queremos ajudar de alguma forma e não nos contentamos em ficar somente observando a situação. Esse sentimento, capaz de nos fazer ir além, chama-se “compaixão”.
A empatia e a compaixão diferem num ponto fundamental: a empatia é a experiência emocional dos sentimentos de uma pessoa. É, de certa forma, o espelhamento automático da emoção dela; é sentir o que ela sente. Já a compaixão ativa uma resposta empática ao sofrimento da outra pessoa e envolve o desejo autêntico de ajudá-la.
O exercício da compaixão requer ação, como explica a médica psiquiatra formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Dra. Ana Beatriz Barbosa:
Empatia é sentir a dor do outro, se colocar no lugar do outro — mas não tem papel ativo pra mudar a situação, posso sentir empatia, mas não realizar qualquer movimento de transformação. Diferente da compaixão que é a postura de entrar em ação pra transformar a situação.2
Da mesma forma quando estamos em casa, no escuro. Todos vivenciam a escuridão, mas é preciso que alguém ilumine o local. A ação de um auxilia a todos, conforme indica o estudo a seguir.
O exercício da compaixão e seus benefícios
Exercitar a compaixão, além de atingir positivamente a vida da outra pessoa — contribuindo para o bem-estar dela —, traz alegria, realização e enormes benefícios para a saúde física e mental de quem a pratica, prolongando sua expectativa de vida, como aponta o estudo de Steve Cole, da Universidade da Califórnia, Los Angeles, e de Barbara Fredrickson, bolsista da APS, da Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill.3
O estudo avaliou os níveis de inflamação celular em pessoas que se descrevem como “muito felizes”. A inflamação está na raiz do câncer e de outras doenças, e geralmente é alta em pessoas que estão sob forte estresse. Podemos esperar que a inflamação seja menor em pessoas com níveis mais altos de felicidade. Cole e Fredrickson descobriram que este era apenas o caso de certas pessoas “muito felizes” — considera-se “pessoas felizes” as que tiveram uma vida com propósito ou significado. Uma vida de significado e de propósito é mais focada em satisfazer aos outros e menos a si mesma. É rica em compaixão e possui significado elevado.
Assim, vemos que a compaixão pode impulsionar nosso bem-estar porque ajuda a ampliar nossa perspectiva. A pesquisa mostra que a depressão e a ansiedade estão ligadas a um estado de autofoco, uma preocupação com “eu, eu e eu”. Ao fazermos algo para outra pessoa, no entanto, esse estado de autofoco muda para o estado de “outro foco”, assim quando nos dedicamos a apoiar um amigo.
O estudo mostrou que a falta de conexão social representa um grande prejuízo para a saúde, maior que a obesidade, o tabagismo e a pressão alta. As pessoas que se sentem mais conectadas com as demais apresentam as menores taxas de ansiedade e de depressão. Além disso, os estudos indicam que elas têm elevada autoestima, são empáticas, confiantes e cooperativas; como consequência, são mais abertas a confiar e a cooperar com as outras pessoas. A conexão social, portanto, gera um ciclo de retorno positivo de bem-estar social, emocional e físico.
Ampliar as conexões
A compaixão na visão budista é o esforço contínuo e corajoso para focalizar o bem em todas as pessoas, não importando quem elas sejam nem como se comportam. Significa se empenhar com o firme comprometimento de cultivar as qualidades positivas em si e nos outros. A fonte da energia vital que nos enche com essa coragem é a própria recitação do Nam-myoho-renge-kyo.
Assim como no exemplo da escuridão, quando ampliamos o foco de nossas orações e ações pela nobre causa do kosen-rufu, isso também abarcará todas as nossas preocupações.
No trecho do romance Revolução Humana, de autoria de Daisaku Ikeda, presidente da Soka Gakkai Internacional (SGI), há uma orientação do segundo presidente da Soka Gakkai, Josei Toda, da perspectiva de Ikeda sensei:
A palestra de Josei Toda (...) era sobre a missão da Soka Gakkai. Ele explanou sobre a situação selvagem e violenta da sociedade, e enfatizou que a única forma de salvar as pessoas dos sofrimentos se encontrava em lhes ensinar o Budismo de Nichiren Daishonin. E convocou a todos para que se dedicassem à felicidade de cada indivíduo, do povo japonês e, ainda, das pessoas do mundo inteiro. Em seguida, expressou sua alegria pela enorme boa sorte de ter obtido a percepção do Buda em seu corpo ordinário durante a prisão. Disse que era mais do que natural compartilhar essa alegria com as pessoas que estão sofrendo:
— Em outras palavras, essa ação natural é decorrente de nossa missão de Buda. Então, o ato de nos tornarmos a fonte da compaixão para proporcionar felicidade às pessoas, como missionários do Buda, chama-se shakubuku. O shakubuku é a missão e a crença da Soka Gakkai. Portanto, nós somos as pessoas de enorme boa sorte, de profunda realização do Buda, ao mesmo tempo em que devemos transmitir essa convicção para a sociedade.4
A transformação da sociedade acontece de maneira profunda quando cada indivíduo se movimenta para realizar a própria revolução interior. Ao elevar sua condição de vida, desperta em si o sentimento de compaixão que o leva a entender que mesmo as pessoas de quem não gosta possuem qualidades que podem ser contributivas e isso abre a oportunidade de expandir a humanidade de si e do outro. E significa que, ao experimentarmos a felicidade com a prática da fé, despertamos para a verdade do potencial de buda na vida das pessoas ao redor iniciando uma onda de incentivos e de encorajamento que pode transformar o mundo inteiro.5
É literalmente buscar iluminar os cantos escuros do coração de cada indivíduo com o próprio exemplo, e permitir que os outros iluminem as penumbras do nosso coração. Assim, nós nos tornamos mais humanos, compassivos e contributivos para a criação de ambientes harmônicos e construtivos ao nosso redor. Em larga escala, significará ampla mudança social. Por fim, o mundo será beneficiado.
Agir pela felicidade do outro
Como vimos na ilustração e ao longo do texto, oferecer apoio às pessoas que sofrem — compaixão — possibilita que elas se inflamem de coragem e enfrentem com sabedoria seus desafios, além de provocar um senso de realização para quem faz isso. Quando nos deparamos com o sofrimento de uma pessoa, vimos outro buda com o potencial de transformação. E, à medida que nos levantamos para conscientizá-lo disso, nós também nos aprimoramos. O presidente Ikeda esclarece esse ponto:6
Todos nós somos pessoas comuns. Apesar disso, temos que realizar o trabalho do Buda. Por quê? É porque, felizmente, nós somos budas cujas sementes foram plantadas no tempo sem início.7 Quando analisamos a nós próprios levantando-nos com essa autoconsciência, conseguimos entender honestamente qual é essa missão. Cada um tem a liberdade de interpretar isso como um conto de fadas ou uma lenda, ou como os ditos dourados de Daishonin. Mas qualquer um que praticar corretamente conseguirá entender que essa é a real natureza da vida. É justamente porque a vida de vocês, propriamente dita, já tem plena ciência desse fato, independentemente de se estão percebendo ou não. Há uma enorme diferença entre entender esse fato teoricamente e por meio da prática. Gostaria que vocês despertassem para a sua missão de vida em meio à prática da fé. Nós pedimos para nascer nesse mundo de caos sem precedentes para cumprir nossa missão como emissários do Buda aparentando ser pessoas comuns. Se continuarmos presos a esse aspecto de pessoas comuns sem despertarmos para o fato de que na verdade somos budas, não haverá sentido de praticarmos o budismo.
Viver a compaixão no dia a dia é recitar daimoku do juramento pelo kosen-rufu, incentivar cada pessoa com calorosos diálogos, atuando na propagação dos ensinamentos do budismo e contribuindo ativamente para a transformação de vidas “muito felizes”. A postura genuína de iluminar a vida do outro, demonstrando na prática o vasto potencial de ultrapassar as próprias questões, enquanto inspira os demais, trará incontáveis benefícios também para si. Dessa forma, ilumine todos com seu brilho interior.
No topo: Presidente da SGI, Dr. Daisaku Ikeda, discursa na Reunião Nacional de Líderes da Soka Gakkai (Tóquio, 2006) Foto: Seikyo Press
Notas:
1. Terceira Civilização, ed. 537, maio 2013, p. 18.
2. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=upGzHKfLGVs. Acesso em: 4 mar. 2023.
3. Disponível em: https://lojongapp.com/blog/article/3/compaixao-nosso-primeiro-instinto. Acesso em: 4 mar. 2023.
4. IKEDA, Daisaku. Revolução Humana. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. 2, p. 248, 2022.
5. Brasil Seikyo, ed. 2.356, 28 jan. 2017.
6. IKEDA, Daisaku. Revolução Humana. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. 3, p. 136, 2022.
7. “Tempo sem início” (jap. kuon ganjo): Significa “remoto passado” (kuon) e “começo” ou “fundação” (ganjo). Embora seja expresso como passado longínquo, seu significado real indica a origem da vida que transcende a dimensão do tempo infindável.
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