Entrevista
RD
Inspirar as pessoas por meio da escrita
Reynaldo Bessa - Escritor
01/06/2020
Com esse desejo, Reynaldo Bessa escreve livros para que possam tocar o coração dos seus leitores e enriquecê-los. O premiado escritor compartilha seu conhecimento e difunde a importância da leitura
—Conte-nos um pouco de como a escrita entrou na sua vida?
Tive o privilégio de possuir um mediador de leitura na minha família: meu irmão mais velho. Ele era um leitor voraz e isso despertou a minha curiosidade para saber o porquê de uma pessoa passar horas imersa num livro. E quando me aventurei nisso, foi mágico, senti‑me atravessando o espelho de Alice.
Dessa experiência me arrisquei em algumas linhas, e aos poucos nasceram versos mais consistentes. Já são oito livros publicados. Sou poeta, mas me arrisquei também em outros gêneros, como o conto, a crônica e o romance. A escrita é parte do meu dia a dia.
—O senhor tem licenciatura em letras; então pode nos falar sobre a sua decisão pelo curso?
Já era graduado em língua portuguesa e em inglês — com tradução- —, mas quis a licenciatura em letras porque descobri o desejo de compartilhar meu conhecimento de escrita e de literatura com os alunos. Por isso, fiz outra graduação. Um escritor não necessariamente precisa fazer faculdade de letras, porém, todo conhecimento é válido. Tudo serve como experiência.
—São muitos os prazeres e as dificuldades da profissão?
No ofício de escritor, há inúmeros prazeres e dificuldades; fazem parte do processo.
Em minhas oficinas de escrita literária, sempre digo aos alunos que se eles só sentem prazer ao escreverem, precisam rever seus textos, porque algo pode estar errado. Escrever é como qualquer profissão, exige dedicação, superação, disciplina. Não é por ser um ofício criativo que algo virá do nada. Você terá aquilo que deu.
Iniciar um livro é sempre um momento de apreensão: por onde começo? O que e como direi? E ao terminá-lo, surge um sentimento misto de realização e de incerteza. É como pôr um ponto-final numa incógnita. Qualquer pessoa pode contar histórias, mas poucas conseguem contá-las de forma singular.
—Soubemos que ganhou o Prêmio Jabuti em 2009. Como foi esse momento para você?
Ser um dos vencedores do Jabuti (o prêmio literário de maior prestígio no Brasil) foi realmente marcante. Afinal, já são mais de sessenta anos de história, premiando, no início, escritores como Dalton Trevisan, Clarice Lispector e, mais recentemente, Chico Buarque. Mas o que me alegra mesmo é saber que esse prêmio simboliza a coroação de toda a dedicação empenhada desde o início, quando ainda adolescente decidi ser escritor.
Agora, o que o torna mais marcante é o fato de ele ter ocorrido no começo da minha prática budista. Sabemos que no budismo não há milagre — o trabalho precisa ter qualidade; mas também sabemos que, quando decidimos iniciar essa revolução, algo de significativo acontece. Penso que, quando redirecionamos nossa vida, consequentemente algumas pessoas acabam atentando para o que estamos fazendo de melhor.
—Qual o passo a passo da publicação de um livro?
Cada editora possui uma forma de proceder, e com o advento da internet surgiram inúmeras possibilidades de se editar um livro. No formato tradicional, basicamente, a editora recebe os originais, e se tiver interesse por eles, um setor trata das questões legais, enquanto outro cuida dos tópicos necessários para a impressão.
Há vários profissionais envolvidos nesse processo: revisores, diagramadores, designers, fotógrafos etc. Depois de pronto, a editora fornece uma prova (um tipo de protótipo do livro) ao autor ou a uma pessoa responsável por isso. Se aprovada, é enviada para a gráfica e é feita a impressão de determinada tiragem. Após isso, o livro é distribuído e começa uma campanha de divulgação.
—Como é o seu processo de escrita?
Escrevo todos os dias, desde logo cedo, e vou até o meio-dia. Na maioria das vezes, jogo boa parte fora, mas sempre uma ou duas linhas sobrevivem. Tiro a tarde para ler e, quando necessário, faço pesquisas. Até que em determinado tempo tenho o que já posso chamar de um livro. Começo, então, o processo de revisão. Concebo essa etapa como uma ação pós-escrita, mas revisar é também reescrever. Reviso inúmeras vezes, até que o livro se cansa de mim e me abandona. Depois, é desapegar e enviá-lo para a editora.
—Há alguma obra pela qual tenha um carinho especial?
Ainda menino, iniciei minhas leituras pelos livros de aventuras: Robson Crusoé, O Livro da Selva, Alice no País das Maravilhas e outros. Todos eles me impressionaram, mas o que mais me marcou foi o livro As Viagens de Gulliver. Não é uma obra tipicamente para crianças. Percebi logo ao começar a leitura. É uma abordagem — e até irônica — da Inglaterra da época: sua cultura, seus hábitos e costumes, sua política etc. Mas adorei. Há um ponto interessante: Gulliver, viajando pelos mares, aporta em diversos lugares exóticos. Em um lugar, ele é um gigante; em outros, é pequenino ou em seu tamanho normal. Com isso, o autor nos apresenta o conceito de que “pequeno” e “grande” só existe quando em comparação.
—Já pensou em escrever para o público infantojuvenil?
Sim. É um projeto para um futuro breve. Tenho alguns originais finalizados ou em processo de revisão. Utilizando-me de uma analogia com futebol, no momento me sinto como um jogador prestes a bater um pênalti e esse gol não posso perder, pois a criançada é exigente.
—Como fazer parte da BSGI influencia seu trabalho?
Toda grande literatura, de uma forma ou de outra, trata do ser humano e suas questões fundamentais. Nenhum escritor, até onde sei, escreve para si mesmo. Apesar de a escrita ser um ofício solitário, o texto implica mensagem, comunicação, interação e, por que não dizer, vontade de aprimorar o mundo. E a BSGI, organização fundamentada na paz, cultura e educação, de diversas maneiras está imbuída nessa missão também.
Sou uma parte que impulsiona esse grande coletivo de força humanística e, ao mesmo tempo, sou impulsionado por ele. A BSGI me orienta que, independentemente do que eu faça, almeje o único caminho possível: o do humanismo.
—Que conselho o senhor daria a um Estudante que tem o desejo de se tornar um escritor profissional?
A resposta a essa pergunta nunca pode fugir do fato de que a escrita é definitivamente consequência da leitura. Jorge Luís Borges, contista argentino, dizia que o escritor nada mais é que um grande leitor que escreve. Portanto, se quiser escrever, leia bastante e, principalmente, saiba o que ler. Em uma das edições do jornal Brasil Seikyo, o presidente Ikeda elaborou uma lista dos cem livros essenciais da literatura do mundo — a brasileira está lá. É um roteiro pessoal de um grande leitor que se preocupa em formar leitores para o futuro.
Prêmio Jabuti
O mais tradicional prêmio literário do Brasil, concedido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), idealizado em 1958 pelo então presidente do órgão Edgard Cavalheiro, com o interesse de premiar autores, editores, ilustradores, gráficos e livreiros que mais se destacassem a cada ano.
A escolha do animal para representar o prêmio se deu pelo ambiente cultural e político da época, influenciado, sobretudo, pela valorização da cultura popular brasileira, nas raízes indígenas e africanas.
Fonte: www.premiojabuti.com.br
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