Encontro com o Mestre
BS
Kochi — A pura correnteza da hospitalidade
Brasil Seikyo publica, nesta edição, a nona parte da série de ensaios do presidente da SGI, Dr. Daisaku Ikeda, “Viagens Inesquecíveis — Com um Coração como o Sol”, na qual ele narra suas recordações das pessoas com quem criou laços de amizade nas localidades que visitou no Japão e em diversos países, abordando também aspectos da cultura e história locais. A série foi veiculada, a princípio, na revista mensal Pumpkin e em livro; depois também foi divulgada no jornal Seikyo Shimbun
18/11/2021
Kochi é o lugar onde pessoas valorosas que abriram o alvorecer do Japão moderno se levantaram com elevadas aspirações. Essa “aspiração” possui uma consideração que transborda de humanidade. Nesta era de provações, busca-se ainda mais por ligações de pessoa a pessoa e de vida a vida. E principalmente neste momento, vamos aprender com o afetuoso espírito de hospitalidade que pulsa nessa terra do sul de Tosa [antiga província localizada na atual Kochi].
DR. DAISAKU IKEDA
O sol
levanta-se e se ilumina
para construir
o mundo dourado
onde resplandece vida.
O poeta da era Heian, Ki no Tsurayuki, admirava as pessoas que conhecia, assim como escreveu em seu famoso Tosa Nikki [Diário de Tosa]: “Essas são pessoas que possuem aspirações. As profundas aspirações dessas pessoas são tão boas quanto este mar”.1
Kochi é a terra onde as pessoas vivem por aspirações mais profundas que o mar. Nela, resplandecem as fortes aspirações dos vigorosos igossou (“decidido e teimoso”, alusão aos homens de Kochi) e das mães hachikin (“mulheres temperamentais e fortes”, generosas e aversas à derrota).
O Dr. Tomitaro Makino, “pai da botânica japonesa”,2 nascido na cidade de Sakawa, e sua esposa realizaram sua grande aspiração pela decisão de não serem derrotados jamais e pela profunda consideração em relação à vida, mesmo sendo assolados por uma sequência de adversidades.
Em Tosa [antiga província localizada na atual Kochi] da terra do sul, existe um laço caloroso em que se compartilham os sofrimentos e as alegrias, e as pessoas desse local costumam dizer: “Não há por que chorar sozinho”; “Vamos rir juntos”.
Adoro os amigos de Kochi, sempre cheios de cordialidade e de gentileza, os quais têm algo em comum com os edokko [pessoas nascidas em Tóquio, como o presidente Ikeda].
Indestrutíveis como uma enorme rocha
[Nota do Editor: Neste ano [2020], comemoram-se 65 anos desde a primeira visita de Ikeda sensei a Kochi. Relembrando a luta pela expansão do movimento popular que empreendeu junto com os companheiros de Kochi de sua confiança, ele escreveu a respeito do aspecto dos preciosos amigos que tinham suas raízes fincadas na localidade e eram estimados pelas pessoas ao redor.]
Guardo eternas lembranças de ter percorrido as vastas terras de Kochi com vista para o magnífico Oceano Pacífico, sentindo ser banhado pelos raios do sol tropical e tocado pelo vento carregado com o cheiro do mar da corrente Kuroshio,3 enquanto fazia baldeação entre trens e carros.
Nesse meio-tempo, o que falávamos mutuamente era em ter uma existência para amar a família, os amigos, a comunidade e contribuir para todos, cada qual à sua maneira.
A verdadeira felicidade não está em algum lugar distante. Não é algo que é concedido de fora. Ela está onde prezamos e zelamos pelas pessoas que estão perto de nós. Em cada canto de Kochi, existem pessoas valorosas, cheias de energia e sabedoria, que estenderam suas raízes na localidade há muitos anos e se dedicam ao bem de todos e são amadas por todos.
São pais e mães admirados com elogios como “É por essa pessoa existir que há felicidade aqui”.
No distrito de Hata, há um casal que se empenha de corpo e alma para fazer o melhor pela felicidade dos amigos da localidade.
Tendo em mente “agir, antes de tudo”, se soubesse de algum amigo com problemas, corria para incentivá-lo, não importando quão íngreme fosse a estrada pelas montanhas nem temendo as estradas pelos penhascos onde os ventos do mar batem forte.
Nos momentos mais difíceis, fazendo do incentivo a paisagem do sol se elevando no horizonte sobre o Oceano Pacífico e tingindo suas águas de dourado cintilante, o casal se levantava, bradando: “Não seremos derrotados! Viveremos como aquela onda majestosa, como aquele penhasco indomável!”.
Uma mãe da cidade de Kochi, que minha esposa conhece bem, é diretora de uma escola de educação infantil.
O ponto de partida para isso foi um pedido da cidade consultando-a se não poderia fundar uma escola de educação infantil, dispondo de parte das terras usadas na agricultura. Foi bem na época em que ela, após se casar com uma pessoa do campo, estava finalmente se acostumando com os trabalhos de agricultura.
Embora ficasse indecisa, por fim aceitou dizendo: “Se todos da região ficarão felizes com isso...”. E, por meio de constante dedicação e extenuantes esforços, ela e sua filha edificaram a escola de educação infantil, o “castelo de esperança das crianças”.
Dizem que “se desejar sinceramente seu desenvolvimento e se envolver de maneira constante com ela, a criança sem falta crescerá forte”.
Com a decisão de lutar também no lugar dos amados esposo e filho falecidos, ela fez da alegria da terra natal o seu orgulho, e veio se dedicando incansavelmente em prol de sua comunidade vivendo perto dela.
Hoje, os formandos se tornaram pais, a escola de educação infantil recebe agora a segunda geração de crianças, e vozes e risadas alegres reverberam na localidade.
A diretora disse com um sorriso estampado no rosto: “É somente gratidão e gratidão poder servir à localidade”.
Que conquistem a felicidade da vitória!
[Nota do Editor: Em Kochi, existe uma beleza natural insubstituível onde resplandece o belo espírito da hospitalidade. Ikeda sensei conclui este ensaio orando para que Kochi prospere ainda mais fazendo brilhar essa tradição que flui nessa localidade, de gentileza e coração puro.]
Em Kochi, reluz a beleza do coração da “hospitalidade”. Assim como é a única dentre todas as prefeituras do Japão a ter um “Setor de Hospitalidade”, Kochi está repleta de um espírito cordial e hospitaleiro, que recebe os visitantes com todo o coração.
A hospitalidade envolve “coisas” visíveis e “atos” que expressam o coração, e se diz que o mais importante é a prestação de “ações” repletas de consideração. O coração não é visível aos olhos. Mas um coração que pensa sinceramente no outro, sem falta, toca a vida dele.
Uma das origens da palavra “hospitalidade” é “não ter duas caras”. Acredito que eu não seja o único a sentir que as “aspirações” da gentileza e da sinceridade, somadas a isso, fluem de maneira pura como o coração da tradição de Kochi.
Em Kochi, existem rica agricultura, comida e cultura, cultivadas pela coexistência harmoniosa entre a natureza e os seres humanos, assim como entre as pessoas.
O Dr. Torahiko Terada, cientista do Japão moderno4 que cresceu em Kochi, escreveu que a lembrança mais saudosa de sua querida avó era a imagem dela manejando a roda de fiar.
As mulheres gostavam de girar a roda de fiar para produzir o tecido manualmente e tinham orgulho disso. Porque nisso encontravam a “alegria de criar coisas” que nenhuma outra diversão poderia proporcionar.
Como todos devem ter sido acalentados pelo dedicado trabalho das mulheres que se esforçaram a fim de criar algo de valor para as pessoas que amam e para a amada localidade, por mais singelo que pudesse ser! Quão nobre e preciosa é essa postura!
Agora, herdando essas aspirações de seus avós e pais, a geração mais jovem, que anseia pela prosperidade ainda maior de Kochi, está se levantando unindo forças.
Cantando altivamente a canção Kurenai no Uta [Canção do Vermelho Carmesim], eles avançam visando ao alvorecer da nova “terra da aspiração”!
A canção da província de Kochi também mostra o elevado e nobre espírito de Tosa, que avança rumo ao futuro: “Tosa da prosperidade / Vamos construir e estabelecer / Com ardente brilho / Pleno de luz”.5
Kochi — o grande solo que ostenta esse nome, que significa “elevada sabedoria”, também pode ser escrito como a “terra de luz”, onde resplandece o brilho da esperança. E ainda pode significar “terra da felicidade”, o solo onde floresce o coração da felicidade.
Diariamente, minha esposa e eu oramos para que haja luz da paz e felicidade da vitória na terra de Kochi do país do sul tão admirada por todos.
Resplandecentemente,
em nosso peito
o sol da felicidade.
Publicado no Seikyo Shimbun do dia 21 de julho de 2020.
Fotos tiradas por Ikeda sensei: Acima, Castelo de Kochi zela pelo cotidiano do seu povo desde a era Edo. É designado como importante tesouro cultural nacional (nov. 1990).
Fotos tiradas por Ikeda sensei: vista do magnífico Oceano Pacífico a partir da praia de Katsurahama, conhecida pela estátua de Ryoma Sakamoto (nov. 1990)
No topo: Ao cumprimentar com máximo respeito os “grandes líderes do futuro”, presidente Ikeda visita pela primeira vez o Centro Cultural de Nankoku e incentiva carinhosamente os companheiros (nov. 1990)
Notas:
1. Tosa Nikki. Nova Edição Completa da Literatura Clássica Japonesa, v. 13. Tradução: Escola de Yasuhiko Kikuchi. Shogakkan
2. MAKINO, Tomitaro. Autobiografia de Tomitaro Makino. Kodansha.
3. A corrente Kuro-Shivo, ou Kuroshio, é também chamada Corrente do Japão — uma corrente marítima que, em conjunto com a corrente Oyashio, é responsável pelo Japão ser um polo pesqueiro. Kuro-Shivo, ou Kuroshio, é uma corrente quente, enquanto a corrente Oyashivo é fria. Ao encontro delas, a Kuro-Shivo é a mais densa. Ela passa debaixo da Oyashivo, formando um redemoinho que traz para a superfície fitoplânctons, favorecendo o aparecimento de cardumes que beneficiam a atividade pesqueira.
4. TERADA Torahiko. Reflexões Completas de Torahiko Terada. Iwanami Shoten.
5. A letra da canção da província de Kochi, Canção dos Cidadãos de Kochi, é de autoria de Sadao Nishimura.
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