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O desafio de se fortalecer em meio às incertezas

Bem-estar físico e mental, conexão, soluções tecnológicas, experiências significativas, expressão da identidade e consumo consciente foram levantados em estudos recentes como destaques para a próxima década.1 Isso significa que a sociedade global buscará aplicar esses atributos, até 2030, em âmbitos individuais e coletivos. Ainda assim, fica o impasse: mesmo que nos identifiquemos com eles, enquanto indivíduos, podemos promovê-los em nossa realidade diante de tantos imprevistos e acontecimentos locais e globais, além da correria característica da rotina? Na matéria de Capa deste mês, a partir da entrevista com o presidente da BSGI, Miguel Shiratori, veremos de que forma o Budismo Nichiren, propagado pela Soka Gakkai Internacional (SGI), traz não só respostas, mas caminhos práticos para solucionarmos essa questão.

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01/02/2021

O desafio de se fortalecer em meio às incertezas

Estamos no início de uma década importante para a SGI e para a sociedade. Dentre diversos objetivos, como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU),2 metas e estudos que abrangem esse período, encontramos algumas tendências que direcionarão a sociedade global até 2030.

Pesquisa recente do instituto Ipsos3 destaca a nostalgia, a busca por simplicidade e significado no dia a dia, os questionamentos relacionados ao uso dos dados de consumidores por parte das empresas e o emprego consciente das tecnologias como temas abrangentes e já enraizados nas sociedades, que terão desdobramentos significativos nos próximos anos. 

Por outro lado, foram tantas e tamanhas mudanças que o mundo vivenciou de um ano para cá que até essa pesquisa foi revista, e o próprio instituto identificou que, das doze tendências levantadas, seis foram afetadas por acontecimentos recentes.4 Estas dizem respeito a temas relacionados à saúde (tanto no campo pessoal como no social), ao meio-ambiente e às mudanças climáticas, às incertezas e à desigualdade, aos questionamentos relacionados ao processo de globalização e à importância da autenticidade das empresas em tratar e lidar com temas sensíveis. E tais mudanças, em geral, relacionam-se à prioridade dessas questões na vida das pessoas e aos valores individuais e sociais ligados a elas.

Diante de um cenário instável, inclusive para os institutos que se dedicam a compreender a época e a sociedade, pessoas ao redor do mundo continuam sua busca por:5

• Desfrutar saúde física e mental.

• Conectar-se com e contribuir positivamente para o local em que residem.

• Obter soluções tecnológicas que lhes permitam viver melhor.

• Defender seus direitos e dos demais grupos de afinidade a partir de sua própria postura e atuação dentro dos espaços e comunidades que participam.

• Construir sua identidade, tanto individual como socialmente.

• Vivenciar experiências significativas que as ajudem a lidar melhor com a vida e os desafios da realidade em constante mudança.

Dentre todos os tópicos citados, vale ressaltar um ponto comum: os indivíduos estão cada vez mais conscientes da importância de sua atuação enquanto parte da própria sociedade. Outro ponto de destaque é a grande pluralidade de informações, possibilidades, produtos e serviços que buscam endereçar as necessidades elencadas e a constante atualização à qual elas são submetidas.

Ou seja, até aqui, temos: diversas tendências em constante mudança, preocupação crescente sobre o impacto pessoal na sociedade e distintos caminhos possíveis a seguir. Sem percebermos, com o tempo, essa miríade de estímulos e de possibilidades acaba afetando nossa própria noção de identidade.6 Segundo Zygmunt Bauman (1925–2017), a constante mudança de fatores, produtos, situações e visões com a qual interagimos no dia a dia nos faz questionar quem somos em meio a tudo isso e ao que nos identificamos de fato.

Segundo estudos do sociólogo Ulrich Beck, esse esforço de se reencontrar e se redefinir continuamente acaba sendo desgastante.7 Sabemos disso na prática, pois, em meio de tantas possibilidades, é um desafio reconhecer e filtrar o que realmente expressa nossa identidade e individualidade, ao mesmo tempo em que buscamos nos reconhecer enquanto parte de algum grupo ou local.

O processo de construção da própria identidade é bastante complexo e objeto de análise de diversos estudos. Aqui vale citar que ele possui duas dimensões: a individual e a social.8

Nesta época em que a dimensão social apresenta tantos desafios, temos a oportunidade de aprender um caminho efetivo de direcionar a dimensão individual. O Budismo de Nichiren Daishonin, assim como ensinado pelos presidentes da Soka Gakkai, Tsunesaburo Makiguchi, Josei Toda e Daisaku Ikeda, nos mostra como direcioná-la e fortalecê-la, a fim de conseguirmos lidar com os demais fatores de forma mais sábia. É sobre isso que conversamos com o presidente da BSGI, Miguel Shiratori, em entrevista que apresentaremos a seguir.

Terceira Civilização: A próxima década será marcada tanto pelo enfrentamento de um cenário de grande instabilidade como pela busca de melhores condições de vida nos âmbitos individual e social. De que forma a prática do Budismo Nichiren direciona e apresenta caminhos efetivos perante esse cenário?

Miguel Shiratori: O ponto alto do Budismo Nichiren, propagado pela Soka Gakkai e pela SGI, é o de proporcionar e despertar o dinamismo da vida capaz de transformar quaisquer circunstâncias. Ou seja, cada pessoa, mesmo quando mergulhada em profundo sofrimento, desperta a sua condição de buda — uma natureza de vida absoluta inerente à vida de todo ser humano.

A prática dos ensinamentos do Budismo Nichiren nos possibilita alcançar uma vida plenamente feliz. Esse resultado denominamos “revolução humana”. Diante da crise global que estamos vivendo, entendemos que o caminho para a busca de melhores condições no futuro dependerá de quanto o ser humano se desenvolverá e promoverá as mudanças em sua comunidade ou local em que se encontra.

Sobre o tema “revolução humana”, o presidente da SGI, Dr. Daisaku Ikeda, nos ensina o seguinte:

A revolução humana consiste numa revolução em nossas ações e em nosso comportamento. Significa realizar ações movidas pela compaixão, que nos libertem do ciclo dos seis caminhos e nos conduzam aos estados de bodisatva e de buda... Ela é a base espiritual para orientar tudo para uma direção nova e positiva, inclusive a visão sobre a vida, a sociedade e a paz.9

TC: A década de 2020 a 2030 é bastante significativa para a SGI e para a sociedade. Atualmente, podemos identificar diversas tendências, valores e possibilidades em constante interação e mutação, além dos imprevistos e desafios, em escala individual e global, relacionados a essa década. Em suma, certamente não será um período fácil, e 2020 já deixou isso claro. Na Mensagem de Ano-Novo, o presidente Ikeda afirma:

Em épocas difíceis, nosso espírito sempre foi o de manifestar o “coração do rei leão”, evidenciar nosso poder interior ao máximo e triunfar com sólida união de propósito. Esta é a essência do Budismo Nichiren e o orgulho dos mestres e discípulos Soka.10

De que forma a relação de mestre e discípulo, assim como ensinada pelo Budismo Nichiren, é fator essencial para enfrentarmos esse período desafiador?

MS: A Soka Gakkai, nestes noventa anos de existência, conseguiu propagar o Budismo Nichiren no mundo atual por manter o espírito de mestre e discípulo. Esse sublime espírito é a essência da vida e do budismo. A relação de mestre e discípulo estabelecida pelos Três Mestres Soka é, sem dúvida, o fator essencial para desbravarmos uma nova era de paz no mundo.

TC: De fato, enquanto tivermos como base as orientações dos Três Mestres, trilharemos o caminho elevado da revolução humana e conseguiremos transformar positivamente nossa vida em todos os aspectos e promover o kosen-rufu. Nosso mestre, Ikeda sensei, afirma: “Os próximos dez anos são cruciais para estabelecer e perpetuar com firmeza o poderoso fluxo do kosen-rufu pelo eterno futuro dos Últimos Dias da Lei”.11 O que esse clamor significa para nós, seus discípulos?

MS: A Soka Gakkai surgiu em meio à crise do século 20, uma época de conflitos sem precedentes derivados da Segunda Guerra Mundial. Foi nesse cenário que os mestres e primeiros presidentes da Soka Gakkai, Tsunesaburo Makiguchi e Josei Toda, estabeleceram e difundiram a prática do Budismo Nichiren como a luz da esperança para o povo japonês. Essa missão foi sucedida por Ikeda sensei, que conduziu a ampla propagação da suprema filosofia budista no mundo. Filosofia esta que elucida a essência da existência da vida humana, e de todas as questões da sociedade.

Ikeda sensei, na 47a Reunião Nacional de Líderes da Soka Gakkai, compartilhou o pensamento do primeiro presidente, Tsunesaburo Makiguchi: “Se não transformar fundamentalmente o espírito humano por meio da revolução religiosa, eternamente, não será possível remediar o caos da sociedade humana”.12 Portanto, a diretriz para os próximos dez anos é o profundo sentimento manifestado por Ikeda sensei, em sua decisão de edificar uma nova civilização, que tenha como base o respeito à dignidade da vida e a revolução humana, de forma que ela se concretize em 2030, no centenário de fundação da Soka Gakkai.

TC: Que grandiosa missão! Com relação à maneira com a qual podemos corresponder a tal expectativa, ao final da Mensagem de Ano-Novo, o Mestre solicita:

Que os senhores continuem a iluminar brilhantemente suas famílias, comunidades, locais de trabalho e a sociedade com a luz ilimitada da Lei Mística. E expandam infinitamente nosso movimento Soka de esperança e vitória, dedicado a realizar o ideal de Daishonin de estabelecer o ensinamento para a pacificação da terra e do mundo inteiro!13

De que forma nossas ações individuais fazem diferença na sociedade?

MS: Com as orientações de Ikeda sensei e os ensinamentos do Budismo Nichiren, aprendemos que, quando mudamos nossa vida, o mundo à nossa volta também se transforma. Os benefícios da prática da fé são imensuráveis e vão além dos seus desejos ou objetivos pessoais.

Compartilho um trecho da orientação de Ikeda sensei a respeito:

A mente concentrada da fé no Gohonzon possui poder e funções que são realmente imensos e extraordinários. Quando o motor fundamental de nossa “mente única” — nossa postura interior, ou determinação — começa a funcionar e as engrenagens de todos os fenômenos dos três mil mundos são colocados em movimento, tudo começa a mudar. Movemos tudo para uma direção radiante e positiva.
Quando envoltos pela grandiosa condição de vida do estado de buda, nós próprios, bem como as pessoas que nos cercam e o lugar onde vivemos, irradiamos a luz da felicidade e da esperança. Esse é o poder do Nam-myoho-renge-kyo dos “três mil mundos num único momento da vida”. Assim opera o princípio budista da transformação dinâmica.14

Estabelecendo uma vida plena de felicidade, vamos promover a mudança de toda a sociedade.

TC: Com certeza. Estamos no mês alusivo à “Campanha de Fevereiro”, ocorrida no Distrito Kamata, em 1952. Nessa época, Daisaku Ikeda tinha apenas 24 anos e empreendeu um grandioso movimento que abriu caminho para a concretização dos objetivos do seu mestre. Relatando essa e outras vitórias, o presidente Ikeda sempre ressalta que a vitória ou a derrota de um empreendimento são determinadas nos cem primeiros dias do ano.15

Qual lição prática podemos tirar dessa experiência de Ikeda sensei a fim de aplicá-la nestes primeiros cem dias de 2021?

MS: Na história da Soka Gakkai, em meio à tristeza de todos os membros pelo falecimento de segundo presidente, Josei Toda, em 2 de abril de 1958, Ikeda sensei, como genuíno jovem discípulo, levantou-se corajosamente para empreender uma vigorosa luta em prol da felicidade da humanidade e do kosen-rufu, incentivar todos os membros e consolidar o avanço e a ampla expansão do budismo no Japão. Por essa referência de luta e espírito, como membros da BSGI, vamos nos empenhar em nossas atividades da organização de base e proporcionar amplamente a felicidade de todas as pessoas; assim contribuiremos para a transformação de toda a sociedade.

Esforços concentrados

Se visualizarmos como pontos separados cada tarefa que precisamos fazer, cada tendência que desejamos seguir, e nossa identidade em meio a tudo isso, realmente são demasiadas as preocupações e possibilidades para lidar. No entanto, quando mudamos nosso foco e passamos a priorizar o processo de fortalecimento interior, elevando nossa condição de vida por meio da prática budista, tudo passa a ter um sentido e um direcionamento mais claro. 

Sabemos que esse processo não é fácil devido aos diversos estímulos, impasses e obstáculos apresentados pela sociedade e pela realidade em que estamos inseridos. Por isso, fazem-se necessários o constante contato, o aprendizado e a aplicação prática das orientações do Dr. Daisaku Ikeda em nosso dia a dia. Esse contato diário com a sabedoria do Mestre serve de guia para compreendermos e direcionarmos positivamente cada desafio que enfrentarmos.

Tal processo encontra ainda mais valor quando feito junto com os companheiros da organização, principalmente dos níveis de bloco e de comunidade, com quem nos relacionamos de forma mais próxima e constante. Isso porque, diante dos desafios enfrentados, compartilhar acontecimentos, esclarecer dúvidas e desenvolver projetos em conjunto são fundamentais para nosso desenvolvimento enquanto indivíduos.

Com esse esforço diário para elevar a condição de vida, nós nos conscientizamos da nossa habilidade em fazer a diferença na sociedade, ao mesmo tempo em que verificamos com quais tendências e valores realmente nos identificamos e como os promoveremos em nosso contexto específico. Assim como Miguel Shiratori colocou na entrevista, criaremos, a partir de nossos esforços concentrados e dedicados, uma nova civilização que tenha como base a dignidade da vida e que seja direcionada pela revolução humana — dois pontos que aprendemos a compreender e a aplicar com a prática do Budismo Nichiren. Sem dúvida, esses esforços serão essenciais para o processo de transformação positiva da humanidade durante os próximos dez anos.

Rumo a 2030

Apesar de as pessoas apresentarem maior consciência do impacto de suas ações na sociedade, muitas podem se questionar como fazer isso em meio a tanta correria, caos e incerteza do dia a dia. Vemos, no entanto, que não se trata exatamente do que fazer com o que nos é apresentado, mas com que base o indivíduo norteia sua vida e suas ações.

O presidente Ikeda afirma:

Pessoas são a base da sociedade e das nações, e as ações delas são moldadas por ideias, filosofias e religiões.
A condição da sociedade depende, em larga escala, dos princípios e objetivos que norteiam a vida. Por isso, é vital que cada indivíduo possua uma sólida filosofia de vida. (…)
Nichiren Daishonin declara: “Uma pessoa de verdadeira sabedoria não é aquela que conduz a prática budista isolada do mundo, mas que compreende perfeitamente os princípios que o regem” (CEND, v. II, p. 391).16

Por mais que modos de vida, tendências e até valores culturais possam ser mudados, enquanto nos dedicarmos de forma diligente à prática do budismo, verdadeiros com relação à nossa essência, não há nada que não possa ser compreendido, transformado e direcionado positivamente. Assim, passaremos de pessoas que buscam identificação exterior para pessoas que direcionam a vida a partir da condição interior mais elevada, das orientações do Mestre e do desenvolvimento ao lado dos companheiros da organização. Esses esforços sinceros para nos fortalecer em meio às incertezas nos capacitarão a abrir caminho rumo uma década de transformações positivas em toda a sociedade.

Notas:

1. https://downloads.mintel.com/private/n1eJW/files/807443/

2. http://www.agenda2030.com.br/

3. https://www.ipsos.com/en-dk/global-trends-2020

4. https://www.ipsosglobaltrends.com/covid-19/

5. https://downloads.mintel.com/private/n1eJW/files/807443/

6. http://www.fronteiras.com/en/videos/identidade-pessoal

7. https://www.researchgate.net/publication/277262638_A_individualizacao_em_Ulrich_Beck_analise_da_sociedade_contemporanea

8. http://www.uel.br/ccb/psicologia/revista/textov2n13.htm

9. IKEDA, Daisaku. Coragem. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, 2019. p. 22, 23.

10. Brasil Seikyo, ed. 2.544, 19 dez. 2020, p. 2.

11. Ibidem.

12. Brasil Seikyo, ed. 2.538, 7 nov. 2020, p. 3.

13. Brasil Seikyo, ed. 2.544, 19 dez. 2020, p. 2.

14. Brasil Seikyo, ed. 2.275, 16 maio 2015, p. B2.

15. Brasil Seikyo, ed. 2.021, 30 jan. 2010, p. B6; cf. Brasil Seikyo, ed. 1.998, 8 ago. 2009, p. A4.

16. Brasil Seikyo, ed. 2.337, 27 ago. 2016, p. B3.

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