Na prática
TC
O primeiro passo para a vitória
O mês de fevereiro reserva uma data muito significativa na história do budismo: no dia 16, comemoram-se os oitocentos anos de nascimento de Nichiren Daishonin (1222–1282),1 e, em virtude dessa celebração, a editoria Na Prática apresentará episódios memoráveis da trajetória de vida do Buda. Um dos traços marcantes de Daishonin era sua personalidade aguerrida de confrontar as injustiças perpetradas pelos poderosos japoneses — por “poderosos” entende-se os líderes religiosos e chefes governamentais. Seu intento era salvar as pessoas do infortúnio. Diante disso, levantou-se para bradar contra os falsos ensinamentos que ofuscavam o coração e a mente do povo japonês e das autoridades da época, e exatamente por essa razão foi acossado sem clemência. Mesmo assim, Daishonin manteve absoluta crença de que seus ensinamentos poderiam alterar o destino do país e aliviar o sofrimento do povo. Dessa forma, com a própria vida, Nichiren Daishonin nos ensina que, mesmo diante dos mais severos desafios, ao confiar em si e no poder da Lei Mística, tudo pode ser transformado.
01/02/2021
O início do Budismo Nichiren
Nichiren Daishonin nasceu numa família humilde de pescadores na vila de Kominato, atual província de Chiba, no Japão, local cercado por um belíssimo panorama natural de mar e rios. Seu pai se chamava Mikuni no Tayu, e sua mãe, Umeguiku nyo. Quando criança, um acontecimento o marcou profundamente. Num dia de trabalho, um grupo de pescadores foi surpreendido por uma forte tempestade e não retornou ao vilarejo. Com esse episódio, Daishonin — que nessa época se chamava Zennichi-maro — passou a inquirir sobre a natureza de vida e morte, e deu início ao caminho em busca da resolução para suas indagações.
Aos 12 anos, Zennichi-maro deixou a casa dos pais para estudar o budismo no templo Seicho-ji, da escola budista Tendai. Foi nesse período de estudo que determinou se tornar a pessoa mais sábia do Japão para retribuir, especialmente aos seus pais, todo o acolhimento caloroso em sua infância. Anos mais tarde, aos 16, entrou para o sacerdócio com o intento de se aprimorar ainda mais nos estudos budistas, peregrinando por vários templos em Quioto, Kamakura e Nara, considerados os principais centros de ensinamento daquele período do Japão.
Após anos de pesquisa e profunda contemplação, retornou ao templo Seicho-ji, e em 28 de abril de 1253, aos 32 anos, revelou a conclusão do seu estudo de vasta coleção dos sutras de Shakyamuni. Nessa ocasião, declarou que o Nam-myoho-renge-kyo é o ensinamento que poderia salvar toda a humanidade e, diante de todos os presentes, manifestou a decisão de rechaçar as maldades que causavam o sofrimento das pessoas. A partir de então, mudou seu nome para Nichiren. Esse episódio é conhecido como o estabelecimento de seus ensinamentos.
Vida destemida e triunfante
Depois de revelar o Nam-myoho-renge-kyo, a vida de Nichiren Daishonin se transformou radicalmente. Ele sabia que os sofrimentos vivenciados pelo povo do Japão eram resultado do pensamento das correntes religiosas arraigado na vida, na cultura e na postura das pessoas. Daishonin considerava que a única maneira de transformar o destino dos japoneses e, consequentemente, do país era a mudança de conduta filosófica abraçando a Lei Mística e seus ensinamentos.
Assim, em julho de 1260, Nichiren Daishonin endereçou ao governante da nação, Hojo Tokiyori, seu tratado de admoestação Estabelecer o Ensinamento para a Pacificação da Terra (Rissho Ankoku Ron), no qual declara que a causa de todas as calamidades enfrentadas pelo Japão estava na crença em religiões errôneas. Esse fato estimulou ainda mais a ira das autoridades da época. A partir de então, iniciou-se uma corrente de perseguições e atentados contra a vida de Daishonin. Contudo, mesmo diante das mais terríveis punições ele não se acovardou, acreditando no poder transformador do Nam-myoho-renge-kyo e em sua capacidade de contribuir para a felicidade do povo.
Passados oito séculos, ainda hoje a bravura de Nichiren Daishonin em se manter fiel às suas convicções possibilita que milhares de pessoas ao redor do mundo, inspiradas por seus ensinamentos, transformem drasticamente o curso da vida. No Estudo desta edição, o presidente da SGI, Dr. Daisaku Ikeda, enfatiza que o primeiro ponto essencial para edificar uma vida invencível é acreditar em si mesmo, assim como apresentado na trajetória arrebatadora da vida de Nichiren Daishonin. E para elucidar, vamos conhecer a história, apresentada no romance Nova Revolução Humana, de um jovem que possuía distrofia muscular (doença sem cura) e por isso vivia abatido e sem esperança.
Não seja derrotado por si mesmo
Em dezembro de 1981, Shin’ichi Yamamoto (pseudônimo do presidente Ikeda na obra) participou de uma atividade no Auditório de Shiragiku, na província de Kumamoto.2
Ao entrar na sala durante a reunião, Shin’ichi avistou um jovem numa cadeira de rodas e, antes de tudo, foi ao seu encontro.
Ele era Hironori Nonaka, estudante do primeiro ano do ensino médio, que estava internado em uma casa de repouso devido à distrofia muscular. Por conta da doença, ele não tinha esperanças e levava dias de angústia e de sofrimento, mas ao ouvir um relato de um membro da Divisão Masculina de Jovens que havia superado a meningite purulenta, ele se levantou decididamente e começara a se empenhar com seriedade na prática budista.
Ao ficar em pé ao lado de Hironori Nonaka, Shin’ichi Yamamoto disse-lhe tocando seu ombro: “— Viva com força. Não existe ninguém que não possua uma missão. Vencedor é alguém que não é derrotado por si mesmo”.
Nonaka sentiu que ouvia pela primeira vez palavras que não eram para confortá-lo, e sim incentivos que inspiravam a vida.
O jovem obteve o diagnóstico de distrofia muscular antes de ingressar no ensino fundamental e o médico lhe disse que seria difícil viver até o sexto ano. Ele frequentou a escola da clínica onde estava internado e cursou o ensino médio por correspondência. Na clínica em que estava, dezenove amigos faleceram seguidamente.
Ao receber os incentivos de Shin’ichi, ele decidiu: “Talvez minha vida seja curta. Mas quero viver ao máximo cada dia e cumprir até o fim a minha missão” — a maneira de viver de Nonaka, que mesmo possuindo uma desvantagem chamada doença, procurava avançar rumo ao futuro com seriedade, força e entusiasmo e emocionava profundamente os amigos da mesma geração.
Ele recebeu a solicitação de uma escola de ensino médio da província para fazer um discurso no festival cultural e, com o título “Coragem de Viver”, fez seu relato de luta contra a doença e dos planos e das decisões contidos em seu coração. Seu depoimento provocou uma grande comoção.
Mesmo ciente do curto período de vida, o jovem Nonaka, ao ser incentivado por Shin’ichi a acreditar em si mesmo, não permitiu que a doença o mantivesse acorrentado à fatalidade do destino e viveu com energia e entusiasmo irradiando felicidade até os momentos finais de sua breve existência.
Viver com confiança
Mesmo os mais diversos desafios que vivenciamos — seja pelas limitações físicas, tal como Nonaka, seja pelas questões insensatas impostas pela perversidade humana, a exemplo das diversas manifestações de preconceitos ou dos grandes tormentos e perseguições como os que o buda Nichiren Daishonin sofreu —, o importante é seguir em retidão, com confiança e força sem se intimidar ou se acovardar.
Em um discurso, o presidente Ikeda cita o pensamento do ensaísta britânico William Hazlitt (1778–1830) sobre acreditar em si mesmo:3
Ele escreveu que se acreditarmos que podemos vencer, nós venceremos, afirmando que a confiança é um pré-requisito para a vitória. A crença de que vencerão sem falha concentra toda sua força, até mesmo aquela que é normalmente latente, e faz seu triunfo tornar-se realidade.
Em outro trecho consta:
O poder da crença e do pensamento levarão a realidade em direção àquilo que acreditamos e concebemos. Se realmente creem que podem fazer algo, vocês podem. Essa é a realidade.
Quando os senhores prefiguram o resultado da vitória, gravam isso em seu coração e mantêm-se firmemente convictos de que o atingirão, seu cérebro faz todo o esforço para realizar a imagem mental que os senhores criaram. E então, através de seus incessantes esforços, essa vitória torna-se finalmente uma realidade.
Portanto, assim como apresentado por Ikeda sensei, independentemente das condições, não é possível fugir da realidade. Mesmo diante das adversidades, ao manifestar uma inabalável convicção, a sabedoria se manifesta no mesmo instante. E foi dessa forma que Nichiren Daishonin conduziu sua jornada de vida triunfante, confrontando as adversidades e incentivando tenazmente seus discípulos a confiar em si e na força do Nam-myoho-renge-kyo até o momento de sua morte, em 13 de outubro de 1282.
Tudo dará certo
Ao acreditar que seus ensinamentos transformariam essencialmente a compreensão das pessoas de sua época sobre a própria vida, Nichiren Daishonin reuniu força e coragem para enfrentar duras perseguições. E atualmente, pela postura e convicção de Daishonin em não recuar um passo sequer, as pessoas do mundo, ao abraçarem seus ensinamentos, podem fortalecer a crença em si próprias, transformar seu destino e contribuir para que outras pessoas também o façam.
O segundo presidente da Soka Gakkai, Josei Toda, alinhado com o pensamento de Daishonin, certa vez disse:4
Não há necessidade de se colocarem para baixo nem muito menos tentarem mudar a maneira como são. Se perseverarem em sua prática budista, então esses traços de caráter que julgam ser um problema se transformarão nas mais naturais virtudes. Vivam com confiança e sejam fiéis a si mesmos.
O importante é, independentemente do que aconteça, jamais se afastar do Gohonzon. É ter coragem, esperança e continuar a lutar. As pessoas, ao observarem essa postura elevada, são inspiradas por esse modo de vida. E o primeiro passo para isso é acreditar em si, pois, dessa forma, tudo, exatamente tudo dará certo!
Notas:
1. De acordo com o calendário tradicional japonês, a pessoa possui um ano no momento em que nasce.
2. IKEDA, Daisaku. Nova Revolução Humana, v. 30-II, p. 78-80.
3. Brasil Seikyo, ed. 1.596, 24 mar. 2001, p. C2.4. Brasil Seikyo, ed. 2.139, 14 jul. 2012, p. B2.
4. Brasil Seikyo, ed. 2.139, 14 jul. 2012, p. B2.
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