Brasil Seikyo
Por clique para buscar
EntrarAssinar
marcar-conteudoAcessibilidade
Tamanho do texto: A+ | A-
Contraste
Cile Logotipo
Especial

A história dos pioneiros que desbravaram o caminho dourado do kosen-rufu — Parte 5

Em 2015, a BSGI completou seu 55o aniversário de fundação, que ocorreu em 19 de outubro de 1960, com a visita do presidente Ikeda em sua primeira viagem internacional para difundir os ideais humanísticos do Budismo de Nichiren Daishonin pelo mundo. Neste ano (2016), a BSGI comemora os 50 anos da segunda visita do presidente Ikeda ao Brasil, ocorrida em 10 de março de 1966, ocasião em que ele desembarcou na cidade do Rio de Janeiro. A fim de comemorar essas datas significativas, a TC publica momentos marcantes de alguns dos pioneiros que deram os passos iniciais para desbravar o kosen-rufu numa terra desconhecida, tendo de ultrapassar diversas adversidades, sem jamais se esquecer do juramento seigan de realizar o shakubuku — compartilhar a prática budista com os demais. A base da matéria são o livro Minshu koso Oja [Verdadeiro Monarca é o Povo] e as edições de maio a julho de 2014 da revista Ushio.

ícone de compartilhamento

16/07/2016

A história dos pioneiros que desbravaram o caminho dourado do kosen-rufu — Parte 5

Tornem-se grandes árvores

Naquela segunda visita ao Brasil, o presidente Ikeda teve a oportunidade de conhecer a cidade do Rio de Janeiro e, na ocasião, deixou a seguinte diretriz para os companheiros cariocas:

— Para tudo existe um tempo oportuno. Vocês devem ter notado muitas árvores jovens [ainda pequenas] enquanto caminhávamos até aqui. Durante os próximos anos, elas crescerão e se tornarão grandes árvores. A organização do Rio de Janeiro é ainda pequena, porém, se empreenderem todos os esforços, recitando firmemente daimoku, certamente ela atingirá um grande progresso (NRH, v. 11, p. 27).

“Havia uma pequena muda próxima de Ikeda sensei”, conta o casal Tadamasa e Michiko Kochi, que conduziam o presidente.

Ficava no morro do Corcovado, de onde se tinha a visão da Cidade Maravilhosa [Rio de Janeiro], em março de 1966.

Daquela ocasião, o presidente Ikeda deixaria registrado: “Onde quer que fosse, minhas ações eram vigiadas pela polícia política” (Ikeda Daisaku Zenshu [Obras Completas de Daisaku Ikeda], v. 87).

“Acredito que o presidente Ikeda sabia perfeitamente por quantas dificuldades passaria o Brasil”, disse Fukuko Oda.

Depois da visita ao Rio de Janeiro, ele seguiu para São Paulo, onde realizou diversas reuniões de diálogo, tomando todo o tempo de sua agenda, sem descanso.

“Numa pequena sala em São Paulo, que sequer tinha 16 m2, o presidente Ikeda perguntou sobre a situação da sociedade brasileira a cada um dos presentes. Para mim, ele disse: ‘É a Sra. Oda? Estou ciente de tudo’. Nos momentos de dificuldade sempre me lembro do seu olhar afetuoso e do ambiente aconchegante daquele diálogo”, relembra Fukuko Oda.

O presidente Ikeda também deixou registrado: “Para começar, não havíamos feito nada de mal. Foi tudo devido a calúnias. Além do mais, havíamos sido rotulados por alguns japoneses e nikkeis de ‘comunistas’ e que ‘faziam uso da violência’. A vigilância da polícia política era rigorosa, e não havia o que fazer. Fui ao ginásio [de esportes do Pacaembu] a fim de participar da última reunião. Esse local estava cercado por aproximadamente duzentos policiais. Estavam posicionados tanto na entrada como na saída. Devido a essa situação, não tive alternativa senão deixar o país após a estada de quatro dias e três noites” (Ibidem).

Visita cancelada

Oito anos depois, em março de 1974, o presidente Ikeda se encontrava nos Estados Unidos. Ele aguardava a liberação do visto de entrada no Brasil. Como não conseguira até o momento da partida do Japão, solicitou novamente quando já estava em terras norte-americanas. Era para se tornar a terceira visita dele ao Brasil, mas, enfim, o visto não foi emitido.

Como citado anteriormente, o governo militar brasileiro barrou a entrada dele no país. Uma das razões que fizeram com que a autoridade brasileira tomasse tal posição foi a calúnia de outras religiões praticadas pelos imigrantes japoneses contra a Soka Gakkai.

O atual presidente da BSGI, Júlio Kosaka, relembra: “Mais que dentro do próprio país [Brasil] partiram muitas informações mal-intencionadas [a respeito da organização] que foram transmitidas do Japão [para o governo brasileiro]”.

“Por meio da sociedade nikkei [no Brasil] fora divulgado falso rumor de que ‘a Soka Gakkai é perigosa’, e assim fomos obstruídos. Solicitamos por várias vezes a emissão do visto de entrada [do presidente Ikeda], mas não obtivemos sucesso e, no final, não havia mais tempo hábil”, conta Eduardo Taguchi, ex-presidente da BSGI [que antecedeu o Sr. Kosaka].

[Naquela ocasião de 1974] tocou o telefone na Sede Central da América do Sul [atual prédio da Sede Social da Divisão Feminina da BSGI], em São Paulo. Era uma ligação internacional do presidente Ikeda. Ele disse:

— Realmente, não é possível ir.

Roberto Saito, na época responsável da organização pela América do Sul, ouviu essas palavras ditas por Ikeda sensei segurando o fone na mão e procurando conter a tristeza que afluía em seu peito. O presidente Ikeda continuou ao telefone:

— Sei quão indignado e triste está. Contudo, esta situação deve ser encarada como a manifestação da sabedoria do Buda. Com toda certeza, há um profundo significado em tudo isso. Há oca­siões em que uma vitória pode ser a causa da derrota no futuro. Da mesma forma, a derrota pode ser transformada em causa da vitória. Espero que o Brasil se levante agora e avance com firmeza, fazendo desta situação a causa para a grande vitória no futuro. Agir dessa forma é agir com determinação embasada na prática da fé. Se olharmos em longo prazo, perceberemos que, quanto maior a dificuldade, maior será o fortalecimento. Esse é o princípio do budismo. Embora não possa viajar desta vez, irei sem falta em outra oportunidade para incentivar os companheiros do Brasil. Está bem? (NRH, v. 11, p. 60).

Imaginando o impacto dessa notícia no coração do líder no Brasil, o presidente Ikeda completou:

— Por favor, sem mostrar lágrimas, procure incentivar os membros com alegria e dedicação. E transmita a todos minhas melhores recomendações (Ibidem).

Era véspera do festival cultural que fora preparado para recepcioná-lo no país, e que envolvia tanto os companheiros da Amazônia como os de Encarnación, na região sul do Paraguai, além de outros representantes de diversas localidades da América do Sul, que estavam reunidos em São Paulo, após percorrerem vários dias de viagem em ônibus fretado.

Esse se tornou o único festival cultural em que a presença do presidente Ikeda foi impedida por oposição do Estado.

Setsuko Takeyama, na época coordenadora da Divisão Feminina de Jovens da BSGI, conta: “É a recordação mais triste que tenho. No dia do festival cultural [de 1974], recebemos uma mensagem do presidente Ikeda que dizia: ‘Desejo que não se esqueçam que há uma pessoa neste vasto mundo que está profundamente, muito mais profundamente do que qualquer pessoa, observando atentamente os senhores’”.

As considerações do presidente Ikeda não se resumiram a esta única vez. De New Orleans, Flórida e do Panamá, ou seja, a cada vez que se deslocava, continuava a enviar longas recomendações para o Brasil.

Uma semana depois, ele participou do festival cultural realizado no Peru, e gentilmente enviou para São Paulo o adorno que fora colocado em seu paletó.

“Era a mensagem de que ‘Mesmo que eu não possa ir, meu coração está junto com o Brasil”, relembra Eduardo Taguchi.

O vazio que durou dezoito anos — a terceira visita fora programada várias vezes, mas sempre era cancelada. Em cada uma dessas ocasiões, houve pessoas que incentivavam as demais e juntos foram superando cada um desses momentos. Os discípulos que receberam treinamento do presidente Ikeda [nessas circunstâncias, posteriormente] se tornaram pessoas centrais e pilares de sustentação da BSGI.

Recordando-se daqueles dias, presidente Ikeda deixou registrado:

“A tristeza de vocês que tiveram a visão escurecida pelas lágrimas foi também o meu sofrimento” ([Obras Completas de Daisaku Ikeda], v. 40).

A seguir, conheceremos as ações tomadas pelo presidente Ikeda a fim de incentivar os bravos companheiros do Brasil.

Budismo é para transformar a vida

“Se não tivesse ocorrido a indignação de 1974, talvez não tivéssemos a atual união da BSGI”, relata Helena Taguchi, que foi coordenadora da Divisão Feminina da BSGI. Ela nasceu no bairro de Sumida, Tóquio, e trabalhou por quase quatro anos como funcionária da sede da Soka Gakkai [no Japão].

“O presidente Ikeda sempre escrevia no quadro de avisos do escritório: ‘Vamos realizar hoje o que precisa ser realizado hoje’. Ele escrevia caligrafias [dedicatórias] em centenas de papel shikishi [folha de papel espesso parecido como uma placa] e os enviava aos membros de todo o país. Eu também, enquanto fazia meu trabalho de contabilidade, ajudava na tarefa de secar o sumi [tinta] do shikishi”, relembra Helena.

Quando ela se mudou para o Brasil com toda a sua família, o presidente Ikeda incentivou-a dizendo:

— Aconteça o que acontecer, esforce-se por dez anos.

O marido da Helena Taguchi, Eduardo, foi uma das pessoas que asseguraram [o desenvolvimento] da BSGI ao longo de 43 anos. Para ele, o líder da SGI também enfatizou:

— Levará dez anos para edificar a confiança no Brasil.

Eduardo Taguchi nasceu no bairro de Ara­kawa, Tóquio.

“Meu pai era comerciante que vendia utensílios domésticos. Mas o bombardeio em Tóquio [durante a Segunda Guerra Mundial] fez com que a nossa casa e os produtos comercializados virassem cinzas. Quando evacuaram a região atingida e tivemos de nos mudar para a cidade de Satte, em Saitama, aconteceu de nos deparar com aviões de guerra Grumman, e tivemos de pular no meio da plantação de milho [para não sermos vistos pelo inimigo].”

Quando Taguchi estava com 14 anos, seu pai faleceu devido à tuberculose, deixando esposa e sete filhos. A venda dos utensílios domésticos que era realizada com dificuldade estagnou, e o jovem Taguchi precisou ajudar no sustento da família, junto com o irmão mais novo, fazendo entregas de jornais e de leite.

Sua mãe, Mitsu, que mal pôde frequentar o ensino fundamental, só conseguia ler e escrever hiragana (ideogramas silábicos do alfabeto japonês). As cartas que ela enviava para o presidente Ikeda eram inicialmente escritas de próprio punho com o uso de hiragana, tornando-se longos textos que depois eram passados a limpo pela sua filha.

Ela deixou registrado em suas anotações com o título “Meu Relato de Experiência”:

“No gélido inverno, todas as vezes que enviava as crianças [para o trabalho] ainda na total escuridão às 3 horas da manhã e depois no retorno, recebia meus filhos abraçando-os — que voltavam com as mãos e os pés gelados. Eu chorava pedindo desculpas a eles em meu coração: ‘Desculpem-me, perdoe esta mãe incapaz’. Como sempre, éramos cobrados todos os dias pelos fornecedores que nos exigiam o pagamento das dívidas.

Também havia decidido dar fim às crianças e depois me suicidar para acabar com tanto sofrimento. Pensei seriamente em como conseguir cianeto de potássio [composto químico altamente tóxico]. Certa noite aconteceu, de verdade, de eu colocar as mãos no pescoço da criança que dormia. Mas como poderia matar minhas queridas crianças?”.

Mitsu passou por várias religiões e quando chegara à conclusão “de que estava farta de religião”, recebeu a visita de uma pessoa que compartilhara o quarto do hospital com seu marido, antes de este falecer. Esse colega de quarto era membro da Soka Gakkai e disse a ela: “Se realizar a prática da fé, sem falta irá transformar o destino. Sua vida também melhorará”.

“Ela foi tocada pela convicção dessa pessoa que havia lhe dito essas palavras, e a minha mãe começou a prática [do Nam-myoho-renge-kyo]”, relembra Eduardo Taguchi.

Isso foi em novembro de 1953. Então logo surgiu um atacadista que, apenas na base da confiança, lhes forneceu produtos com pagamento posterior, e assim a loja de utensílios domésticos foi melhorando as vendas.

Marcante encontro com o jovem Ikeda

A primeira vez que Eduardo Taguchi se encontrou com o jovem Daisaku Ikeda, que na época era secretário da Divisão dos Jovens da Soka Gakkai, foi em frente à estação de trem da ferrovia nacional em 8 de agosto de 1957.

“Estava para ser realizada uma reunião de palestra na residência do Sr. Tsuchiya. Fui buscar o secretário Ikeda em frente à estação, indiquei ao motorista de táxi como chegar ao local da atividade, e em seguida pretendia seguir à pé”.

Surpreendendo as pessoas que foram buscá-lo, o jovem Ikeda disse-lhes:

— Vamos juntos. Convidando-as a entrar no táxi.

Para Taguchi de 19 anos, a maior dificuldade era “conversar com os demais”, mas, curiosamente, sentiu vontade de dialogar com o jovem Ikeda. Ele falou esforçadamente no carro sobre as dificuldades que sua mãe vinha enfrentando.

O secretário Ikeda o incentivou no táxi apertado, dizendo-lhe:

— Um jovem precisa ter um grande objetivo. No futuro, torne-se uma pessoa valorosa que possa percorrer todo o Japão. Os bens de um jovem são a sinceridade e a seriedade. Vencerá sem falta no final quem tiver seriedade.

O jovem Daisaku Ikeda tinha saído do Centro de Detenção de Osaka duas semanas antes. Ele fora preso injustamente no Incidente de Osaka. Inquirido com violência pelos promotores, teve de reconhecer relutantemente o crime que não cometera, a fim de proteger o presidente Josei Toda de ser detido pelas autoridades inescrupulosas. Era, então, o período em que o secretário Ikeda havia iniciado uma dramática batalha no tribunal, onde [todos] diziam que a chance de vitória “era menor que 0,1%”.

Era uma noite quente e abafada, quando começou a reunião de palestra na residência dos Tsuchiya. Taguchi e mais um jovem recepcionavam as pessoas (seiri) na área externa, que começou a ficar repleta de participantes por não conseguirem mais entrar no interior da residência totalmente lotado. De repente, uma senhora saiu apressadamente da sala onde ocorria a reunião de palestra e foi atrás do jovem Taguchi e do outro rapaz. Ela tinha em mãos duas tigelas de kakigori (raspadinhas de gelo) com groselha.

Ao encontrá-los, ela disse: “Quando servimos há poucos instantes o kakigori para o secretário Daisaku Ikeda, ele nos indagou: ‘Há também para os dois?’, referindo-se a vocês. Ao ser informado que não havia mais, falou: ‘Então, não posso me servir sozinho. Por favor, ofereça também aos dois’”.

Taguchi surpreendeu-se do fundo do coração. Por que ele [o secretário] se preocuparia com um jovem recém-saído do ensino médio e sem nenhuma capacidade? Como pode se preocupar com os que estão do lado de fora, diante de tantas pessoas reunidas lá dentro?

“Não me esqueço de como estava gelado o kakigori que saboreei no meio da rua na efervescência da reunião de palestra”, relata Eduardo Taguchi.

A partir desse dia, o jovem secretário Daisaku Ikeda atuou por uma semana no bairro de Arakawa, e assim o Bloco Arakawa realizou nesse período 280 shakubuku, que representavam 10% da quantidade total de famílias que compunham a organização local.

Continua na próxima edição.

Compartilhar nas