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O desafio de Shakyamuni pouco antes da iluminação
Presidente da SGI, Dr. Daisaku Ikeda relata os momentos decisivos de Shakyamuni ao lutar contra a negatividade da mente para manifestar o poderoso estado de buda
05/11/2016
Shakyamuni prosseguiu sua meditação sob a árvore Bodhi.
Segundo os textos budistas, nessa ocasião, os demônios começaram a tentá-lo. Os meios desonestos de que se valeram diferem de um escrito para outro, mas é interessante observar que alguns dos recursos utilizados envolviam palavras de aparente gentileza e preocupação.
Numa descrição, por exemplo, um demônio tentou influenciar Shakyamuni sussurrando-lhe suavemente: “Veja como está magro, como seu rosto está pálido. Com certeza deve estar à beira da morte. Se continuar sentado aqui desse jeito, será um milagre sobreviver”.
Depois de apontar o perigo que ele estava correndo e insistir fortemente para que vivesse, o demônio tentou persuadir Shakyamuni a seguir os ensinamentos do bramanismo, e que poderia acumular benefícios grandiosos sem ter de passar por tais sofrimentos. Os esforços de Shakyamuni para atingir a iluminação não tinham sentido, declarou o demônio.
O apelo do demônio nesse contexto pode ser acatado como uma expressão da luta feroz que estava se desenrolando na mente de Shakyamuni naquele momento.
A dúvida o assaltava, esfacelando sua paz interior e tumultuando sua mente. Com o corpo extremamente fraco e sua resistência física praticamente esgotada, o pavor da morte deve ter crescido em seu coração. O tormento mental de Shakyamuni era ainda maior, pois, percebendo que não ganhara nada com as austeridades intensas a que havia se submetido, começou a duvidar e a temer que seus esforços para atingir a iluminação no fim também se mostrassem inúteis.
Ele fora assaltado simultaneamente pelos desejos mundanos, pela fome, pelo desejo de dormir e também pelo medo e pela dúvida.
Demônios e forças diabólicas representam as ações dos desejos mundanos e das ilusões tentando abalar a mente daqueles que buscam o caminho da verdadeira iluminação. Algumas vezes, os demônios assumem a forma de apegos a desejos mundanos, ou da manifestação física da fome ou do sono. Outras vezes eles torturam a mente da pessoa com ansiedade, medo e dúvida.
Sempre que as pessoas são desencaminhadas por essas funções demoníacas, invariavelmente justificam suas falhas de algum modo. Além disso, elas se convencem de que seus pretextos são perfeitamente razoáveis e naturais.
Por exemplo, como na época de Shakyamuni ninguém ainda havia alcançado a iluminação, talvez lhe parecesse bastante razoável questionar se sua meditação sob a árvore Bodhi se mostraria inútil no fim.
Na maior parte das vezes, as funções demoníacas levam as pessoas a se agarrar a alguma conclusão aparentemente sensata que justifique suas fraquezas e necessidades emocionais. Nichiren Daishonin adverte sobre o fato citando estas palavras: “O demônio zelará por ele como um pai” (WND, v. I, p. 770).
Shakyamuni, porém, enxergou a real natureza dessas funções demoníacas e reuniu uma poderosa energia vital, afastando todos os pensamentos geradores de confusão que importunavam sua mente. Ele bradou em seu coração: “Demônios! Vocês podem vencer um covarde, mas o bravo triunfará! Lutarei! Em vez de ceder à derrota, prefiro morrer lutando!”.
Com isso, sua mente voltou a um estado de tranquilidade. O sereno véu da noite o envolveu, enquanto incontáveis estrelas cintilavam no alto com um brilho puro e cristalino.
Depois de vencer o ataque das forças demoníacas, a mente de Shakyamuni ganhou novo ânimo e vitalidade, seu espírito se tornou tão límpido como o céu azul.
Desse modo, ele despertou para a natureza eterna da vida, que se estende pelo passado, presente e futuro. Naquele instante, todos os medos e dúvidas fortemente sedimentados nas profundezas de sua vida desde o nascimento evaporaram. Ele finalmente chegara à raiz profunda e imperturbável de sua própria existência.
Shakyamuni sentiu a escuridão da ilusão desaparecer quando a radiante luz da sabedoria iluminou a sua vida. Tinha liberado dentro dele uma condição existencial semelhante à visão clara e desimpedida, em todas as direções, que se tem no topo de uma elevada montanha.
Durante um tempo, Shakyamuni simplesmente deleitou-se com o sabor de ter despertado para a verdade —, a Lei fundamental da vida e do universo — mas logo começou a se sentir cada vez mais aflito. Enfrentava um dilema: deveria pregar essa Lei aos outros ou permanecer em silêncio? Sentado à sombra da árvore Bodhi, torturou-se por vários dias com tal dúvida.
Ninguém jamais ouvira falar, muito menos explanado, essa Lei magnificente e inigualável. Havia uma lacuna imensa entre o reino resplandecente do interior de seu ser e o mundo real externo.
As pessoas viviam atormentadas temendo a doença, o envelhecimento e a morte. Consumidas pelo desejo, brigavam constantemente umas com as outras. Tudo se devia à ignorância delas acerca da Lei da vida. Mesmo que lhes ensinasse a Lei em benefício delas próprias, talvez ninguém a compreendesse.
Shakyamuni se sentiu completamente só. Era a solidão dos seres genuinamente iluminados, algo que somente aqueles, e ninguém mais, que obtiveram a compreensão de um profundo princípio, conhecem.
Um relato descreve a reaparição de demônios nesse momento para atormentar Shakyamuni. O episódio pode novamente, ser interpretado como uma luta contra as funções demoníacas de sua própria vida, que agora tentavam dissuadi-lo de ensinar a Lei às outras pessoas.
Shakyamuni não conseguia conter esse surto de dúvida e hesitação diante da ideia de seguir em frente e disseminar a Lei. A decisão sobre o que fazer o mortificava.
As funções demoníacas continuaram, portanto, a afligir Shakyamuni, mesmo após ele ter se tornado buda. Elas competiam entre si para atacá-lo por mínima brecha que encontrassem em seu coração.
Um buda não é sobre-humano. Aquele que alcança esse estado continua a vivenciar problemas, sofrimentos e dor, e ainda está sujeito a doenças e a ser tentado pelas forças demoníacas. Por essa razão, buda é uma pessoa dotada de coragem, tenacidade e ação constante, que luta incessantemente contra elas.
Por mais elevado que seja o estado alcançado por nós, sem esforços persistentes para avançar e nos aprimorar, nossa fé pode ser destruída num instante.
Em um texto budista, o deus Brahma surgiu diante do ainda indeciso Shakyamuni e rogou-lhe que pregasse a Lei a todas as pessoas. Esse episódio simboliza a poderosa determinação que brotou da vida de Shakyamuni de prosseguir e cumprir sua missão.
“Seguirei adiante!”, decidira peremptoriamente. “Aqueles que buscam aprender, com certeza ouvirão. Aqueles com poucas impurezas compreenderão. Sairei em meio às pessoas, tão envoltas pela desilusão e ignorância!”
Uma vez tomada a decisão, sentiu uma nova onda de energia fluir dentro dele. Nesse momento, o grande leão se levantou pela felicidade da humanidade.
Extraído da obra Nova Revolução Humana, volume 3, capítulo “O Buda”.
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