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Diálogo Sobre Religião Humanística
O ensino para livrar a humanidade do sofrimento em uma “era de conflito”
Diálogo Sobre Religião Humanística
TC
O ensino para livrar a humanidade do sofrimento em uma “era de conflito”
01/07/2004

Pres. Ikeda: Naturalmente, Nitiren Daishonin é o precursor dos Bodhisattvas da Terra mencionados: foi ele quem revelou o Gohonzon. Nesse sentido, ganha importância sua declaração “nesta era”. Citando um comentário do Grande Mestre Dengyo, Daishonin a descreve como uma “era de conflito”.43 Referindo-se aos dias em que viveu, ele interpreta “era de conflito” como os “dois desastres da revolta interna e invasão pelo mar ocidental que estão ocorrendo no presente”. (WND, pág. 376.)
Saito: Estes são desastres preditos na “Tese sobre o estabelecimento do ensino correto para a paz da nação” (1260). O desastre da revolta interna ocorreu em fevereiro de 1272,44 um ano antes de Daishonin escrever “O objeto de devoção para a observação da mente”. O desastre da invasão estrangeira, referida nesse escrito como “invasão pelo mar ocidental”, ocorreu sob a forma de incursão das tropas mongóis em território japonês.
Pres. Ikeda: O fato de os Bodhisattvas da Terra aparecerem e estabelecerem o objeto de devoção em uma “era de conflito” é uma prova eloqüente de que o budismo é um ensino para a paz e a felicidade de toda a humanidade.
Os conflitos geram brutalidade em dobro. Primeiro porque ferem diretamente a vida. Segundo porque dilaceram o coração das pessoas e rompem as relações entre elas. Com essa dupla função, os conflitos são uma atividade “demoníaca” que destrói o “cosmos” ou a ordem harmoniosa da vida humana. A guerra é desprezível, cruel e bárbara. Porém, é exatamente em uma era de conflito como essa que os Bodhisattvas da Terra estabeleceram o Gohonzon para livrar as pessoas do sofrimento.
No início deste diálogo, consideramos a relação entre a Cerimônia no Ar e o formato do Gohonzon. Gostaria de reconfirmar essa idéia. O Gohonzon inclui todos os seres dos Dez Mundos. Do ponto de vista da Cerimônia no Ar, todos os membros da assembléia, sem exceção, encontram-se incluídos nela.
Os ensinos provisórios expostos antes do Sutra de Lótus abandonaram os seres dos seis caminhos e dos dois veículos (ou seja, os ouvintes e os que compreendem a causa) e, por fim, os bodhisattvas. Eles ainda demonstravam um certo desprezo aos nove mundos. O Sutra de Lótus enfoca exatamente o oposto.
Morinaka: De fato, há religiões que só aspiram à salvação dos “escolhidos” ou de um grupo seleto de pessoas.
Pres. Ikeda: A configuração do Gohonzon sugere a igualdade e a nobreza de todas as pessoas. O Gohonzon (Nam-myoho-rengue-kyo) tem o poder de gerar harmonia e cooperação, e de acabar com divisões e conflitos. Tem a capacidade de salvar as pessoas dos seis caminhos, que são as que mais sofrem. Os Bodhisattvas da Terra são aqueles que manifestam esse poder.
Daishonin diz: “Em análise final, se não conseguirmos demonstrar que este ensino é supremo, os desastres continuarão irrefreáveis.” (WND, pág. 1114.) Conseqüentemente, a missão dos Bodhisattvas da Terra é triunfar, haja o que houver, na luta entre a natureza do mal e a natureza do Buda. Se esses bodhisattvas não prevalecerem sobre o mal, o mundo continuará eternamente preso a um ciclo de mal irreversível. Quando triunfamos sobre o mal, a natureza do Darma manifesta-se e um mundo harmonioso de unicidade entre o bem e o mal se concretiza.45
Saito: A inclusão de Devadatta no Gohonzon pode ser interpretada como uma exortação ao triunfo sobre a natureza malévola inerente à vida.
Pres. Ikeda: Correto. Segundo as escrituras, Devadatta caiu no Inferno ainda vivo e a causa disso foi a desconfiança, a inveja, a arrogância e o ódio que nutria pelas pessoas. Em qualquer outra religião, aquele que se opusesse com extrema aversão e tentasse matar seu fundador e figura central seria condenado ao sofrimento eterno. Porém, a brilhante luz da benevolência do Sutra de Lótus resplandece até mesmo sobre o fatídico Devadatta, que havia caído no pior estado de sofrimento, o mundo de Inferno.
Saito: No 1º capítulo do Sutra de Lótus, “Introdução”, um raio de luz emana do tufo de cabelos brancos que Sakyamuni tem entre as sobrancelhas e ilumina o mundo nas dez direções como um farol. Essa luz chega até mesmo ao inferno de incessante sofrimento.
Pres. Ikeda: Em “Registro dos Ensinos Orais”, Daishonin afirma: “A luz do tufo de cabelos brancos é Nam-myoho-rengue-kyo.” (Gosho Zenshu, pág. 712.) Como essa luz ilumina todos os domínios dos dez mundos, todos os “seres dos dez mundos podem manifestar o estado de Buda simultaneamente” (Ibidem).
Ele ainda declara: “Portanto, sou levado à conclusão de que esse trecho [sobre o raio de luz] ‘atingindo até mesmo as profundezas do inferno Aviti’, significa que o Buda irradia sua luz para guiar Devadatta ao estado de Buda.” (Ibidem.)
Morinaka: Daishonin diz que o raio de luz que chega até o inferno de incessante sofrimento e possibilita que as pessoas ali atinjam o estado de Buda em sua presente forma refere-se ao poder do Daimoku de transferir benefícios aos falecidos (cf. Gosho Zenshu, pág. 712).
Isso nos leva a uma questão: Será que Sakyamuni perdoou o perverso Devadatta?
Pres. Ikeda: Sakyamuni admoestou e refutou Devadatta várias vezes por suas maldades. Disso não há dúvidas.
Na realidade, é denunciando o mal que podemos fazer com que as pessoas más abram os olhos. Isto porque o ressoar das vozes que bradam pela justiça da Lei Mística tem o poder de ativar a natureza de Buda dormente no coração de uma pessoa influenciada pelo mal. No entanto, como uma pessoa assim se encontra fechada em um muro de pedra de ignorância, uma voz fraca não conseguirá chegar até ela. É preciso uma voz forte, rigorosa, capaz de frear o mal para quebrar essa dura parede e iluminar a natureza de Buda.
Saito: Isso se aplica aos quatro tipos de seguidores que perseguiram sem descanso o Bodhisattva Jamais Desprezar. Como esse bodhisattva continuou respeitando cada um deles apesar das hostilidades e de seus ataques, os quatro tipos de seguidores começaram a sentir arrenpendimento por suas ações. Daishonin explica isso em “A Seleção do Tempo”.46 A prática de venerar os outros do Bodhisattva Jamais Desprezar equivale a uma refutação do mal.
Pres. Ikeda: Esse bodhisattva continuou a lutar até conseguir prevalecer. Se a justiça se cala, o mal prolifera ainda mais. Persistir em reprovar o mal até que seus perpetradores despertem e se arrependam é agir com benevolência.
Morinaka: No Japão, muitos ainda não entendem isso. Acham que apontar uma única vez algo que está errado já é o bastante e que isso é agir com tolerância.
Pelo fato de Sakyamuni ter sido inflexível em sua advertência a Devadatta, até mesmo este pôde sentir arrependimento. Mas, de acordo com “A Seleção do Tempo”, por causa de seu mau carma, Devadatta só conseguiu gritar “Namu (Devoção)!” antes de cair no inferno de incessante sofrimento.47 Foi exatamente em direção a esse inferno que Sakyamuni lançou o raio de luz da Lei Mística.
Pres. Ikeda: O que está representado no Gohonzon não é simplesmente o Devadatta que cometeu atos de traição contra Sakyamuni e que foi atormentado pelo sofrimento extremo. Em vez disso, no Gohonzon vemos um Devadatta que, iluminado pela luz da Lei Mística, tornou-se um devoto da Lei no mundo de Inferno e que assumiu a missão única de gerar harmonia dentro desse domínio mais deplorável. O estado de Buda dessa pessoa perversa, Devadatta, abre o caminho para a manifestação do estado de Buda em inúmeras pessoas maldosas.
Já havíamos falado sobre os três significados do caractere myo. O objeto de devoção do Budismo de Nitiren Daishonin tem o poder harmonizador que várias religiões buscam como ideal. Precisamente por essa razão, Daishonin inscreveu o Gohonzon durante uma “era de conflito”, um período da mais profunda escuridão.
Saito: No Japão, que se tornou o ponto de partida e o centro do Kossen-rufu — a ampla propagação da Lei Mística nos Últimos Dias da Lei —, há uma profunda relação entre “propagação do ensino” e “conflitos”. Daishonin inscreveu o Gohonzon nos tempos da invasão mongol, uma ameaça de proporções inigualáveis para a nação. A Soka Gakkai também nasceu em meio a acontecimentos que conduziram à Segunda Guerra Mundial, uma época de conflitos sem precedentes, e o presidente Toda iniciou a propagação da Lei Mística nas condições desoladoras do pós-guerra. O núcleo dessa propagação é o Gohonzon. Sustentando o juramento de seu mestre e predecessor, Tsunessaburo Makiguti, o presidente Toda levantou-se com a determinação de salvar, por meio da Lei Mística, o povo japonês que passava por um sofrimento indescritível com a crise do pós-guerra.
Pres. Ikeda: Todos os esforços do presidente Toda pelo Kossen-rufu tinham como ponto de partida o Gohonzon — a chave de tudo. A aurora do Kossen-rufu irrompeu no meio da noite de 3 de julho (de 1945), no dia em que Jossei Toda foi libertado da prisão. Tudo começou no lar de meu mestre.
Morinaka: No capítulo “Alvorada”, do primeiro volume do romance Revolução Humana, o senhor descreve esta cena da história da Soka Gakkai:
“No quarto do andar superior, as cortinas cobriam as janelas impedindo a passagem da luz.
“Jossei Toda ajoelhou-se diante do oratório, envolto no profundo silêncio que precede um ataque aéreo. Colocou entre o lábios uma folha de shikimi48 e lentamente desconsagrou o Gohonzon. Tirou os óculos e observou de perto cada ideograma, inclinando-se tanto sobre o pergaminho que seu rosto quase o tocou.
“‘É isso mesmo. Não há o menor erro. É exatamente como vi...’, murmurou baixinho, profundamente satisfeito pelo fato de a solene e misteriosa Cerimônia no Ar que ele havia presenciado em sua cela estar realmente descrita e representada no Gohonzon. Uma alegria incontida tomou conta de todo o seu ser, enquanto as lágrimas banhavam seu rosto. Com as mãos trêmulas, clamou das profundezas de seu ser: ‘Gohonzon! Daishonin! Eu, Toda, hei de realizar o Kossen-rufu!’
“Toda sentiu uma chama ardente acender em seu coração, enchendo seu ser de incandescente luz. Era uma chama que nada poderia apagar, que parecia arder com vontade própria. Nesse dia, irrompeu em seu coração a chama eterna e imortal da alvorada que iluminaria o caminho para a concretização do Kossen-rufu.”
Pres. Ikeda: O presidente Toda relatou-me diversas vezes essa experiência. Ele queria compartilhar comigo a alegria incontida que experimentou nessa ocasião.
Foi o ponto de partida de uma propagação inédita do Gohonzon, um feito sem paralelo nos setecentos anos que havia transcorrido desde a morte de Nitiren Daishonin. Graças ao juramento do presidente Toda e seu desejo de guiar as pessoas à felicidade por meio do Gohonzon, o espírito de Nitiren Daishonin propagou-se hoje pelo mundo inteiro.
Conforme Daishonin declara na conclusão de “O objeto de devoção para a observação da mente”, o Gohonzon incorpora a benevolência do Buda. Porém, se orarmos a ele sem tomar nenhuma ação concreta em prol do Kossen-rufu, a imensa benevolência do Buda Original jamais permeará nossa vida. Somente quando manifestamos o “mesmo espírito de Nitiren” e nos tornamos “discípulos de Nitiren”, ou seja, quando nos levantamos com a mesma determinação de Nitiren Daishonin pelo Kossen-rufu, é que essa imensa benevolência flui em nossa vida como um grande rio.
O benefício do Gohonzon é inesgotável. É tão ilimitado e absoluto que não dá sequer para compará-los aos benefícios que recebemos ao longo de nossa prática até o presente momento.
A mudança do destino da humanidade é o benefício supremo do Gohonzon, e o que está tornando isso possível é a fé da Soka Gakkai.
Chegou o momento de nossa rede de Bodhisattvas da Terra, que hoje se estende a 185 países e territórios,49 revelar o extraordinário poder benéfico do Gohonzon e dissipar a escuridão e a ilusão que envolvem o mundo.
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